Tuesday 24 March 2009

REFORMA DO ESTADO - DE NOVO - PAPEL DO ESTADO

A reforma do Estado no centro da agenda
Cristiano Romero
25/03/2009
A reforma do Estado brasileiro estará, necessariamente, na agenda do próximo governo, seja ele qual for. O governo Lula, embora tenha contribuído para a estabilização da economia, deixará uma herança pesada na área de pessoal. Em seis anos de gestão, Lula aumentou em 98% a despesa com servidores civis, contratou 201.090 novos funcionários e elevou para 76.857 o número de cargos de confiança, um acréscimo de quase oito mil vagas em relação ao último ano do governo anterior. Tudo isso, sem que a sociedade tenha assistido a uma revolução na qualidade dos serviços públicos.
Com a crise econômica, as receitas públicas estão encolhendo, enquanto o gasto criado com pessoal segue crescendo e tem caráter permanente, rígido - não há como diminuí-lo porque a Constituição não permite a demissão de funcionários estáveis nem a redução de salários. A equação fiscal não fecha, o que obrigará o próximo presidente a enfrentar o problema, sob pena de colocar em risco a estabilidade econômica conquistada a duras penas na última década e meia.
O assunto está na agenda dos pré-candidatos. A ministra Dilma Rousseff reconheceu, em entrevista ao Valor, que nos dois mandatos de Lula faltou fazer a reforma do Estado. Essa reforma, disse ela, será um "tema central" a partir de 2011. Os governadores José Serra e Aécio Neves, do PSDB, pensam da mesma forma, embora não se deva esperar dos três o mesmo tipo de solução. Mesmo no atual governo, avesso a reformas, há quem esteja pensando em mudanças radicais na gestão pública.
O ministro Roberto Mangabeira Unger, da Secretaria de Planejamento de Longo Prazo, acaba de concluir uma série de propostas, que ele defende que sejam implementadas simultaneamente e desde já. Elas não enfrentam diretamente o problema do inchaço na máquina pública, mas apontam caminhos para tornar o Estado eficiente. Ainda assim, não parece realista acreditar que o presidente Lula vá mexer com o funcionalismo a pouco mais de um ano da sucessão. Seja como for, as ideias, desenvolvidas em parceria com o Ministério do Planejamento e com sugestões de empresários, estimulam o debate necessário do tema.
O ministro propõe três agendas de gestão. A primeira pretende lidar com um tema do Século XIX - a criação de uma burocracia profissional. "Trata-se de uma obra inacabada no Brasil. Temos ilhas de excelência - o Itamaraty, a Receita Federal - num mar de discricionariedade. A maioria dos ministérios é fantasma", diz ele.
Para enfrentar o problema, o ministro sugere três ações. A primeira é o envio de um projeto de lei ao Congresso, propondo a redução "progressiva e rápida" dos cargos de confiança. Hoje, existem 76.857 desses cargos no governo federal. O ministro sugere que uma boa parcela disso seja substituída por funcionários de carreira. Ele deixa claro que não está propondo o fim das funções de confiança. "O Estado não deve ser comandado por tecnocratas, mas, sim, pela política", ressalva.
A segunda ação proposta é a ampliação da proporção das carreiras horizontais, isto é, daquelas que podem servir a qualquer ministério, como os atuais gestores públicos. Segundo Mangabeira, a experiência internacional mostra que a vanguarda do serviço público está justamente nas carreiras multifuncionais. A terceira ação é criar, nos Estados, escolas de serviços públicos voltadas para a formação de carreiras horizontais - no governo federal, quem já cumpre esse papel é a Enap.
A segunda agenda é a do Século XX, ou seja, a da busca da eficiência. A ideia é instituir quatro formas de avaliação dos serviços prestados pelo Estado: a autoavaliação dos servidores; a avaliação externa, conduzida pelo Ministério do Planejamento; uma outra avaliação externa, eventual, contratada fora do Estado; e a avaliação feita pelos usuários, como fazem alguns países europeus.
O segundo ponto dessa agenda é a reconstrução do Direito Administrativo, que, na opinião de Mangabeira, oscila hoje entre a rigidez e a discricionariedade. A Lei de Licitações (8.666) é um exemplo de rigidez que, na prática, torna o Estado ineficiente. As leis ambientais, por sua vez, favorecem as decisões discricionárias - um exemplo: a dificuldade de se obter autorização para a construção de hidrelétricas. No primeiro caso, a proposta é promover uma revisão "radical" da 8.666. No segundo, é acabar com a possibilidade de discricionariedade. "O Direito Ambiental brasileiro é o não-Direito. Delega poderes discricionários quase irrestritos a um elenco de pequenos proprietários administrativos, que, com isso, organizam um despotismo não esclarecido", critica Mangabeira. "O resultado prático é transformar cada licenciamento num jogo de influência, de pressão. É uma miopia dos ambientalistas gostar disso. Eles podem gostar enquanto os amigos deles estiverem no poder. Quando os adversários estiverem, não gostarão."
A terceira agenda é a do Século XXI, "do experimentalismo". Um de seus propósitos é reconstruir o federalismo brasileiro, substituindo o modelo de repartição estanque de competências por outro, cooperativo, que associe os três entes da federação em ações comuns. Mangabeira propõe que se comece a fazer isso na educação, com a criação de entidades "transfederais" para zelar pela qualidade do ensino em todo o país, assumindo a gestão de escolas que não atendam a determinados índices de desempenho.
O outro ponto da terceira agenda diz respeito à prestação de serviços públicos pela sociedade civil. O ministro alega que prevalece no Brasil uma espécie de "fordismo" administrativo - a provisão de serviços padronizados e de baixa qualidade pelo aparato burocrático. São serviços de qualidade inferior aos prestados pela iniciativa privada a quem tem dinheiro para pagar por eles. Mangabeira sugere que o Estado financie a sociedade civil para que ela participe da prestação "competitiva e experimental" de serviços, por exemplo, nas áreas de educação e saúde. "Não é privatização", garante. Os colégios de aplicação ligados a universidades federais, menciona o ministro, são uma experiência bem-sucedida que poderia ser replicada para o ensino fundamental.
Cristiano Romero é repórter especial e escreve às quartas-feiras.
E-mail cristiano.romero@valor.com.br



Saídas pós-crise internacional
Marcio Pochmann
26/11/2009
O sistema capitalista revela, em suas crises periódicas, momentos de profunda reestruturação. São oportunidades históricas em que velhas formas de valorização do capital sinalizam certo esgotamento, enquanto novas formas ainda não se apresentam plenamente maduras no centro dinâmico do mundo.
É nesse sentido que algumas das saídas para o mundo pós-crise internacional já podem ser vislumbradas. A primeira vincula-se à reconstrução do modelo de globalização neoliberal que produziu, entre outras coisas, uma inédita era de monopolização econômica em poucas empresas globais. Até antes da crise mundial, cerca de 500 grandes corporações transnacionais geravam faturamentos anuais que, acumulados, chegavam a se aproximar de metade do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. No contexto pós-crise, possivelmente um contingente ainda menor de corporações transnacionais tende a estar mais concentrado em mais atividades econômicas, apontando para o grau de monopólio privado sem paralelo histórico. Essa realidade faz com que países deixem de ter o controle das empresas para que as grandes corporações transnacionais passem a deter países, com faturamentos anuais superiores ao PIB de nações.
O quadro de instabilidade nas atividades econômicas que decorre da maior imperfeição na competição entre as forças de mercado a partir de poucas e gigantescas corporações transnacionais, que por serem muito grandes não mais podem quebrar sob o risco de levar ao colapso o próprio sistema econômico, tende a ampliar o papel do Estado. Isso porque a ruína da crença neoliberal explicitada pela crise atual tornou profundamente desacreditadas tanto a vitalidade dos mercados desregulados como a suficiência do sistema financeiro internacional liberalizado. Até o momento, contudo, além das ajudas estatais inimagináveis às grandes corporações transnacionais (bancos e empresas não financeiras), pouco se avançou em termos de transparência, supervisão e controle dos mercados, sobretudo o financeiro.
Mas a contenção dos efeitos das crises econômicas gerados pela baixa capacidade regulatória da competição intercapitalista dificilmente poderá ocorrer sem avanço no grau de coordenação das políticas governamentais. A consequência do estreitamento da relação orgânica do Estado com o processo de acumulação privada pode ser o aprofundamento da competição entre os Estados nacionais. Ou seja, maior intensidade entre os conflitos mundiais. Esse é um risco que não pode ser descartado especialmente quando o poder de governança global encontra-se estacionado junto com os problemas não resolvidos do século passado. O G-20, nesse sentido, representa uma nova possibilidade de regulação global, embora não possua ainda o mesmo caráter institucional presente na Assembleia das Nações Unidas e suas agências multilaterais.
Uma segunda saída da crise internacional relaciona-se ao movimento de deslocamento do centro dinâmico do mundo, especialmente com relação ao relativo esvaziamento econômico dos Estados Unidos. Diferentemente das experiências históricas anteriores, como no caso da transição da hegemonia inglesa para a dos Estados Unidos, que foi gradualmente consagrada entre a crise de 1929 e o fim da Segunda Guerra Mundial, notam-se que as possibilidades atuais se dão por meio da construção de um mundo com novas centralidades supranacionais (policentrismo). Os controversos sinais de decadência dos Estados Unidos parecem ser mais relativos do que absolutos, tendo em vista a desproporção econômica, tecnológica e militar ainda existente em relação ao resto do mundo. Apesar disso, observa-se que no contexto de emergência da crise no centro do capitalismo mundial ganham maiores dimensões os novos espaços de centralidades mundiais no sul da América Latina, para além dos Estados Unidos, União Europeia e Ásia.
Por fim, uma terceira saída da crise internacional relaciona-se ao estímulo à mais rápida internalização da revolução técnico-científica no processo de produção e consumo em grande escala global. Pelo conhecimento produzido até o momento acerca da insustentável degradação ambiental gerada pelas atuais práticas de produção e consumo, dificilmente poderá ter vida longa uma saída de crise que se espelhe na mera reprodução do modelo passado. Para que isso não ocorra, a matriz energética mundial precisa ser recomposta enquanto viabilidade do ponto de vista econômico (lucrativas). Com isso, as penalizações governamentais às atividades de produção e consumo degradantes ambientalmente não apenas devem crescer como um conjunto de inovações técnico-científicas deve apontar para algo menos estimulador das mudanças climáticas.
Da mesma forma, o avanço da sociedade pós-industrial, cada vez mais portadora do trabalho imaterial, tende a favorecer a reorganização no espaço urbano, até então prisioneiro das antigas exigências do exercício do trabalho em locais determinados, como a fazenda para a agricultura e pecuária e a fábrica para a manufatura, entre outros. Pelo trabalho imaterial, a atividade laboral passa a ser exercida em qualquer local, não mais em espaços previamente determinados e apropriados para isso, bem como em qualquer horário. Ou seja, o trabalho realizado sem grandes deslocamentos cotidianos.
Com isso, a reorganização social em comunidades territoriais locais torna-se cada vez mais possível, reduzindo o comprometimento temporal com os deslocamentos da casa para o trabalho e vice-versa, entre outras tarefas do cotidiano. Mas para isso, o fundo público precisará ser fortalecido com o objetivo de contribuir para a nova redistribuição dos espaços urbanos. A elevação do fundo público seria politicamente correta se ocorresse em cima da tributação das atividades de produção e consumo ambientalmente degradantes. Assim, seria também interessante considerar cada vez mais as novas fontes de riqueza que se vinculam ao trabalho imaterial, até o momento pouco conhecidas e quase nada tributadas.
Todas essas possibilidades de saídas da crise internacional constituem oportunidades singulares que podem ser aproveitadas por todos os países, especialmente os não desenvolvidos. O Brasil já demonstrou historicamente capacidade de aproveitar as oportunidades das crises, bem como aponta recentemente para que isso ocorra por meio das medidas internamente tomadas. O fato de ter saído melhor do que se encontrava antes do início da crise internacional indica que o caminho não está errado e deve ser aprofundado.
Marcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor licenciado do Instituto de Economia, é pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas. Escreve mensalmente às quintas-feiras



Fórum Econômico: Pesquisa mostra ainda empresas otimistas com 2010
Pós-crise, executivos temem excesso de regulamentação
Sergio Leo, de Davos27/01/2010
Clima frio: participantes caminham do lado de fora do centro de convenções onde é realizado o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça
A interferência dos governos foi importante para estabilizar o setor privado no auge da crise financeira, mas tornou-se grande preocupação para os empresários, constatou a pesquisa anual feita pela PriceWaterhouseCoopers com cerca de 1.200 executivos de cinquenta países, tradicionalmente divulgada na véspera do Fórum Econômico Mundial, na Suíça. Os executivos estão com "otimismo cauteloso" e planejam contratações nos próximos doze meses, mas uma grande parcela desses empresários elege o perigo de "excesso de regulamentação governamental" como a maior preocupação, agora que a crise parece caminhar para o fim.
"Temos de assegurar que os governos não colocarão barreiras que reduzam a velocidade da recuperação econômica mundial", comentou o presidente da PriceWaterhouseCoopers, Dennis Nally, ao Valor. "Não podemos voltar ao protecionismo, nem a regulamentações populistas", comentou, usando o adjetivo com que agentes do mercado têm marcado as recentes medidas de controle do sistema financeiro decididas pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.
"A maneira como os bancos centrais trabalharam colaborativamente é o exemplo do tipo de comportamento que deve servir de modelo", afirmou Nally, condenando as normas decididas unilateralmente por países como os Estados Unidos, o Reino Unido e a França, de taxação dos bônus de altos executivos e restrições sobre os ganhos dos bancos e sobre suas operações.
"São coisas que parecem muito boas ditas ao microfone, atendem a expectativas populares, que buscam culpados", define Nally, quando solicitado a explicar o que são "medidas populistas". O sistema financeiro é complicado e complexo, e, embora o furor popular faça parte do jogo, os governos devem evitar respostas apressadas e fazer consultas mais profundas as especialistas, e entre si, analisa o presidente da empresa de consultoria.
As declarações de Nally dão o tom do que já é uma das marcas desse Fórum Econômico, em Davos. Em lugar de iniciativas nacionais, pede-se mais discussões globais e coordenação em instituições como o G-20, que reúne as economias mais influentes. É no G-20 que os executivos apostam para conter o que consideram excessos regulatórios dos governos. "Respostas emocionais podem parecer satisfatórias no curto prazo, mas não vão resolver", diz.
No que o próprio consultor classifica de um "paradoxo", metade dos empresários pesquisados aprova a ação dos governos na crise, mas um número superior a dois terços se mostra preocupado com o envolvimento de longo prazo do governo nos negócios. Em média, mais de 70% dos executivos temem interferências políticas, distorções do mercado e conflitos de interesse devido à presença estatal.
A sondagem realizada pela PriceWaterhouseCoopers mostra, porém, como o governo vem ganhando espaço: entre os pesquisados, 14% eram estatais, quatro pontos percentuais acima da última pesquisa; e um terço dos entrevistados apontou sociedade do governo na principal empresa de seu setor.
Apesar da boa disposição nas empresas, outro grande temor dos executivos é o risco de prolongamento da recessão. "A avaliação muda conforme os países, mas, em geral, a previsão é de lenta recuperação da economia", comenta o presidente da PriceWaterhouseCoopers. Como o ponto de partida é muito baixo, porém, maior parte acredita em melhora para os negócios.
Mais uma vez, a sondagem mostra os países emergentes como os mais otimistas. Na média, 81% dos executivos acreditam na melhoria de perspectivas nos próximos doze meses. Mas, na América Latina e na China, esse percentual sobe para 91%; e para 97% na Índia. Nos EUA, embora ainda expressiva, parcela de otimistas baixa para 80%.
"É interessante: as maiores, empresas com mais de US$ 10 bilhões em receita, são as mais confiantes", observa o consultor. O otimismo se reflete no mercado de trabalho, tema em que Brasil se destaca por ter 60% dos executivos pesquisados decididos a aumentar o nível de emprego de suas empresas. Na Ásia, na região do Pacífico e no Canadá, metade dos pesquisados fala em mais contratações.
Sinal de que ainda há duvidas sérias no horizonte, 25% do total das empresas pesquisadas fala em cortes de pessoal (no total, 39% vão aumentar seus quadros). Os empresários, em grande parte, lamentam não ter uma política adequada de recursos humanos, o que levou a demissões de talentos que, agora, exigem recontratações ou treinamento custoso de mão de obra.
A sondagem mostra que, para a grande maioria das empresas, o crescimento será baseado em seus próprios recursos e em procedimentos básicos como corte de custos e investimento nas atividades tradicionais. Embora ainda haja interesses em fusões e aquisições, a maior parte das empresas buscará um "crescimento orgânico", segundo Dennis Nally, dando prioridade à gerência mais eficiente de seus recursos próprios. "O foco vai ser no crescimento interno, usando fluxo de capital da própria empresa", prevê. "Durante a crise, muitas firmas com bons balanços e bom histórico se surpreenderam sem conseguir alavancar recursos", lembra



O mal-estar da grande transformação
Luiz Gonzaga Belluzzo
01/06/2010
Edificado sobre os escombros da sociedade destruída pela Grande Depressão e pelos dois conflitos mundiais, o Estado do Bem-Estar figura entre os principais suspeitos acusados de deflagrar a crise fiscal em que se enfiaram os europeus.
Ainda assim, poucos contestam o caráter singular do período de expansão capitalista do pós-guerra, até meados dos anos 70. Os estudos do economista Angus Maddison ("The World Economy, a Millennial Perspective") demonstram que nenhuma outra etapa do desenvolvimento capitalista apresentou resultados tão favoráveis no que diz respeito às taxas de crescimento do produto, salários reais, comportamento da inflação e estabilidade das taxas de juros e de câmbio.
Hoje são majoritárias as opiniões que deploram o peso excessivo do Estado munificente e investem contra as tentativas de disciplinar as forças simultaneamente criadoras e destrutivas do capitalismo. As mudanças tecnológicas, nas formas de concorrência, na organização e na estratégia da grande empresa e, por fim, na operação dos mercados financeiros, ocorridas a partir dos anos 70 do século passado, abriram caminho para grandes transformações.
O processo de mundialização da concorrência desencadeou uma nova onda de centralização de capitais e estimulou a dispersão espacial das funções produtivas e a terceirização das funções acessórias ao processo produtivo. Esse movimento foi acompanhado por uma intensa "apropriação" das decisões e da circulação de informações pelo "cérebro" da finança. Os mercados de capitais tornaram-se, ao mesmo tempo, mais poderosos na formação das decisões e, contrariamente ao que se esperava, menos "eficientes" na definição dos critérios de avaliação do risco.
Essa centralização das decisões associou-se, como já foi dito, à busca incessante de novas áreas "competitivas". Essa aliança impôs à economia global uma dramática ampliação da relação produtividade-salário nos países emergentes e, ao mesmo tempo, favoreceu a má avaliação do risco nos mercados que transacionam direitos de propriedade e títulos de crédito.
Quanto ao Estado Nacional, ninguém duvida de que sua ação econômica foi severamente restringida: assistiu impotente ao desdobramento das estratégias de localização e de divisão interna do trabalho da grande empresa e ficou à mercê das tensões geradas nos mercados financeiros, que submetem a seus caprichos as políticas monetária, fiscal e cambial. Mais do que por seu caráter global, a nova finança e sua lógica tornaram-se decisivos por sua capacidade de impor vetos às políticas macroeconômicas. O desemprego de longo prazo se ampliou nos países centrais, sobretudo na Europa. Nos Estados Unidos proliferou a precarização do emprego, fonte da queda de rendimentos dos 40% mais pobres e, portanto, do aumento da desigualdade.
A estas forças negativas o Estado e a sociedade não podem responder com ações compensatórias de outros tempos porque nos mercados globalizados cresce a resistência à utilização de transferências fiscais e previdenciárias, aumentando ao mesmo tempo as restrições à capacidade impositiva e de endividamento do setor público. Isto porque a globalização, ao tornar mais livre o espaço de circulação da riqueza e da renda dos grupos integrados, desarticulou a velha base tributária das políticas keynesianas erigida sobre a prevalência dos impostos diretos sobre a renda e a riqueza.
A ação do Estado, particularmente sua prerrogativa fiscal, vem sendo contestada pelo intenso processo de homogeneização ideológica de celebração do individualismo que se opõe a qualquer interferência no processo de diferenciação da riqueza, da renda e do consumo efetuado por meio do mercado capitalista. A ética da solidariedade é substituída pela ética da eficiência e, desta forma, os programas de redistribuição de renda, reparação de desequilíbrios regionais e assistência a grupos marginalizados têm encontrado forte resistência dentro das sociedades.
Não há dúvida de que este novo individualismo tem sua base social originária na grande classe média produzida pela longa prosperidade e pelos processos mais igualitários que predominaram na era keynesiana. Hoje o novo individualismo encontra reforço e sustentação no aparecimento de milhões de empresários terceirizados e autonomizados, criaturas das mudanças nos métodos de trabalho e na organização da grande empresa.
A ação do Estado é vista como contraproducente pelos bem-sucedidos e integrados, mas como insuficiente pelos desmobilizados e desprotegidos. Estas duas percepções convergem na direção da "deslegitimação" do poder administrativo e na desvalorização da política. Aparentemente estamos numa situação histórica em que a "grande transformação" ocorre no sentido contrário ao previsto por Polanyi (1980): a economia trata de se libertar dos grilhões da sociedade. As manifestações na Europa sugerem que a sociedade está preparando novas respostas às façanhas da economia do Mal-Estar.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras.




América Latina: o regresso do Estado


Cepal critica cortes de investimento em épocas de baixo crescimento e garante: poderíamos universalizar pensões para idosos sem estourar contas

O investimento público — ou seja, dinheiro do Estado, que vem dos impostos que todos nós pagamos — aumentou na América Latina. Mais do que isso, em 2008 e 2009, os governos da região bateram um recorde ao injetar na economia 28,8% do Produto Interno Bruto (PIB) continental, maior valor já registrado nos últimos 20 anos. Apesar disso, o nível dos gastos públicos tem se matido relativamente estável desde 1990. Os investimentos sociais, porém, cresceram bastante. Se há duas décadas representavam 11,3% do PIB, atualmente absorvem 17,9%. Hoje em dia, a área social — educação, saúde, habitação, saneamento etc. — fica com a maioria dos recursos estatais: 62,2%.
As cifras constam do relatório.....



A INTERVENÇAO DO ESTADO NA ECONOMIA: UMA TAREFA COLETIVA.
Edna de Araújo Andrade




O renascimento do Estado-nação por Dani Rodrik [+ Nakano]
[A crise financeira mundial acabou com esse mito de irrelevante]
Quem socorreu os bancos e evitou a escalada da catástrofe? Quem está revendo a regulamentação dos mercados para impedir outra crise?
VALOR ECONÔMICO, 14-02-2012


PARADOXO DA GLOBALIZAÇÃO [blog uol - vários, dani rodrik]


Teoria Econômica e Estado - de Quesnay a Keynes - by Gentil Corazza



Reforma do Estado e  a tensão entre público e privado
Vera Maria Vidal Peroni (UFRGS)




As mudanças no papel do Estado na decada de 1990 : impactos sobre as relações de trabalho no setor publico  Autor(es): Emilie Cavalcante Ribeiro 2004



Publicado em Econômica, 1 (1), Junho de 1999
MERCADO, ESTADO E TEORIA ECONÔMICA UMA BREVE REFLEXÃO
Fernando J. Cardim de Carvalho



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