FONTE: BBC Brasil (23-03-2020).
O drama do coronavírus (com fortes traços de tragédia) nos deixa em meio a um turbilhão de situações: (i) o que podemos fazer, na quarentena; (ii) nas quase chatas manifestações moralistas, às vezes necessários, de um batalhão de soldados das mídias sociais; (iii) as políticas governamentais para enfrentar a pandemia, no que me interessa, mais as econômicas; (iv) as leituras de livros e de artigos de gente espetacular (já li coisas de Domenique De Masi, relatando o caso da Itália, de Manuel Castells, etc.); (v) a convivência propriamente dita no nosso meio, observando as manifestações, as interpretações - quase todas carregadas apenas de moralismo.Vai para casa já virou até meio pitoresco, dado a gravidade do momento que estamos atravessando; todavia, até certo ponto, é bastante compreensível. Voltando-se um pouco para o centro do furacão, a Medida Provisória 927/2020 (22 de março)** é assunto que chama muito a atenção, pois, é sabido que o mundo muito provavelmente entrará numa crise econômica de proporções arrasadoras - ontem tinha gente falando na possibilidades de 40 milhões de desempregados, no Brasil, com base nas projeções do que pode acontecer na economia dos Estados unidos (Empresários pedem ‘plano Marshall’ e XP fala em 40 milhões de desempregados). Em relação, a MP 927 propriamente dita, o economistas José Luis Oreiro se manifestou de modo bastante duro a respeito do seu sentido, tando em relação a sua crueldade (desumanidade) em relação aos trabalhadores, quanto em relação ao fato de reforçar/agravar o desempenho negativo da economia, em vez de conter os danos que estão por vir.
No caso dessa MP 927/2020, infelizmente, ela aplica/implementa algo que já estava previsto na reforma trabalhista, aprovada no governo de Michel Temer, a qual se dizia que seria a panaceia para a criação de milhões e milhões de empregos. Agora, a MP 927 vem aprofundar certas medidas que não foram possível durante os trâmites da reforma trabalhista, mas que no momento do pânico do coronavírus veio encontrar o ambiente ideal, seguindo a belíssima interpretação de Naomi Klein, denominada "doutrina de choque", desenvolvida detalhadamente no livro homônimo, de 2008, onde mostra como medidas cruéis foram implementadas por George W. Bush, por ocasião do furacão Katrina, em 2005, e por Augusto Pinochet, nos primeiros anos da ditadura chilena (Leia a nota da ANAMATRA contra a MP).
De toda forma, os debates desta Medida Provisória, no parlamento, serão muito úteis; embora, com grandes possibilidades de ser referendada e, salve alguns transtornos, poderá permanecer vigorando por muito tempo.
As demais medidas econômicas, que vêm sendo divulgadas desde a semana passada (incluindo os anúncios da parte do Banco Central, de hoje), possuem uma engenharia bastante diabólica. Não injetam dinheiro na economia, além daquilo que já estava previsto. Como não é tão fácil compreender a situação, passa-se a ideia de que o governo está se movimentando, fazendo alguma coisa. Sobre o enfrentamento de crises, "dessa natureza", talvez o manifesto do economistas portugueses e a carta dos professores do Instituto de Economia da UFRJ sejam úteis para entendermos melhor sobre o abismo que está nos atraindo. Além disso, as próprias medidas bilionárias que estão sendo preparadas pelos governos dos Estados Unidos e pela União Europeia, além da sinalização do FMI de aportar o dinheiro que for necessário.
A vida vai continuando e nós quarentenados, tentando entender o que está acontecendo no mundo do novo coranavírus SARS-CoV-2. O mundo da COVID-19.
"Fiquem em casa" - pegue um livro para ler, também, talvez a humanidade possa sair muito melhor dessa tragédia/drama.
Talvez, posteriormente, venha comentar sobre os impactos diferenciados da crise sobre os distintos segmentos socioeconômicos.
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* G1
** MP 927/2020 faculta às empresas a suspensão dos contratos de trabalho e o pagamento de salários por um período de até quatro meses enquanto durar o estado de calamidade pública.