Tuesday 26 May 2009

KEYNES AND CRISIS V + Presença MINSKY=>(Keynes II e aqui)

Uma cronologia da crise econômica mundial



SCHOOLS OF THOUGHT



Aug 24, 2009
"Why This New Crisis Needs a New Paradigm of Economic Thought"
[More Side of the road blogging - stopped for a moment at the Great Salt Lake.] When I talked to the senate's COP panel, one of many things that I emphasized was the need to develop plans in advance to deal with various contingencies. Without such plans policy actions - even justifiable ones - appear ad hoc and also face resistance that delays their implementation or prevents them from being put into place altogether.
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Eficácia das políticas anticíclicas
Luiz Gonzaga Belluzzo
26/05/2009
Nas recessões moderadas que afetam as economias capitalistas periodicamente, tanto os problemas relativos à geração de lucro, renda, e emprego quanto os patrimoniais (como o grau de endividamento e o risco das posições ativas e passivas) têm origem nas variações dos fluxos do gasto privado de consumo e de investimento.
Tais flutuações provocam movimentos de ajuste na composição e no rendimento dos ativos que podem agravar o declínio do gasto produtivo. Mas esses movimentos cíclicos apresentam, em geral, grande sensibilidade à atuação das políticas anticíclicas que se destinam a defender os fluxos de produção, os preços dos ativos e a validade das dívidas mediante a sustentação da liquidez dos mercados e do lucro das empresas. Essas políticas conseguem preservar as condições patrimoniais do setor privado - empresas e famílias - ao tornar possíveis os movimentos de portfólios na direção de uma maior liquidez e de menor risco proporcionados pelo aumento da dívida pública nas carteiras das instituições financeiras.
A moderada intervenção do Estado repõe as condições para o crescimento dos lucros a partir da elevação do gasto público e a consequente resposta do gasto privado. Sendo assim, instaura-se um novo ciclo de valorização dos ativos produtivos e de recuperação do endividamento privado, o que permite o crescimento da receita de impostos e a progressiva retração do endividamento público. Ocorrendo isto, o Estado poderia refluir a sua ação, reequilibrar o déficit fiscal e reduzir o seu endividamento.
Até aqui estamos no mundo das flutuações ou, no máximo, da instabilidade da produção, da renda e do emprego nas economias capitalistas. Em uma crise como a atual, a avaliação da riqueza (as expectativas de longo prazo) e a incerteza radical (não apenas o risco) paralisam e negam os novos fluxos gasto. A ruptura brutal do estado de convenções que vinha regendo o movimento da economia significa que os produtores e consumidores privados paralisam suas decisões - de produção, consumo e de investimento - diante da incerteza radical em que estão mergulhados. Este é o estado que contrasta com o de "expectativas convencionais": nele os agentes se comportam como se a incerteza não existisse e como se o presente constituísse a melhor avaliação do futuro.
Keynes procurou demonstrar que, em uma situação de ruptura do estado convencional de expectativas, torna-se aguda a contradição entre o enriquecimento privado e a criação da nova riqueza para a sociedade (crescimento das inversões em capital real). A crise leva ao limite o impulso de enriquecimento privado, ao ponto de torná-lo antissocial devido à preferência pela liquidez que impõe a paralisia ao investimento e ao consumo, isto é, à formação da renda e ao emprego. Numa conjuntura de redução drástica do investimento e do consumo privados, as empresas e os consumidores buscam desesperadamente reduzir o endividamento e aumentar a poupança. A ruptura da confiança faz recair sobre o dinheiro a esperança de preservação do valor da riqueza. Isto significa que os detentores de direitos sobre a riqueza são levados a supor a existência de uma medida e forma do enriquecimento que não esteja sujeita à contestação dos demais, a única socialmente reconhecida num momento em que os demais ativos não têm preço porque não encontram compradores.
Nessas circunstâncias, as políticas de Estado de geração do déficit e de criação de nova dívida pública - instrumentos de sustentação dos lucros das empresas e de proteção dos portfólios do setor bancário privado - estão diante de expectativas de longo prazo insensíveis aos estímulos convencionais. Em uma economia que atravessa uma crise como a americana, por exemplo, o desequilíbrio fiscal e o crescimento do débito público na composição dos patrimônios privados tendem a se tornar fenômenos mais profundos e duradouros. Diante de antecipações pessimistas do setor privado, o déficit do governo consegue apenas impedir a queda acelerada da produção e evitar o agravamento da deflação de ativos. Com isso, a crise não é superada, mas ameaça se transformar de crise da finança privada em crise financeira do Estado.
Neste caso, as expectativas privadas passam a se orientar pelas suposições acerca da evolução da "crise financeira do Estado". O fato relevante nos próximos meses será a avaliação dos detentores de riqueza, sobretudo dos controladores do crédito, sobre os rumos da política fiscal e do endividamento público. Há sinais de que os senhores da finança - salvos pela vigorosa intervenção do Estado - já consideram insustentáveis a trajetória do déficit fiscal e da dívida do governo americano. A desconfiança privada atinge a fundo a soberania estatal, comprometendo a legitimidade do Estado como gestor da moeda e da dívida pública.
Diante do avanço das antecipações, o Estado poderá ser levado desvalorizar a sua dívida - agora forma dominante da riqueza privada - mediante a monetização continuada. Com esta providência estará sancionando o encurtamento do horizonte temporal fixado pelo setor privado, na busca de maior segurança e liquidez para o seu estoque de riqueza. Com isso, eleva-se o prêmio de liquidez e restringem-se os mercados para contratos de prazos mais longos, comprometendo a própria capacidade do Estado de emitir dívida nova e de administrar o estoque de endividamento existente. Isto tende a reduzir ainda mais as possibilidades de atuação da política monetária, submetida aos imperativos de taxas de juros reais elevadas, com efeitos desastrosos sobre a recuperação da economia.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras. E-mail: BelluzzoP@aol.com



Nobel de Economia vê lições na crise mundial que devem valorizar a áreade estudos das finanças comportamentais
Psicologia do investidor
Por Luciana Monteiro, de São Paulo
26/05/2009
Ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 2002, apesar de não ser economista de formação, o psicólogo israelense Daniel Kahneman chama a atenção por seu estilo extremamente atencioso para com seus interlocutores. Autor da chamada "Teoria da Perspectiva", juntamente com Amos Tversky, em 1979, o psicólogo mostrou que as decisões econômicas dos indivíduos nem sempre são racionais. A pesquisa econômica até então assumia que pessoas são motivadas por incentivos materiais e tomam decisões de modo a sempre maximizar os ganhos. Kahneman e Tversky mostraram que isso não é bem assim.
Aos 75 anos, o professor de psicologia na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, é uma das estrelas do 5º Congresso Anbid de Fundos de Investimento, que começa hoje. A participação de Kahneman será amanhã. Por telefone, ele falou ao Valor e disse que o atual otimismo dos mercados pode ser considerado irreal. Para Kahneman, as mudanças regulatórias adotadas pelo governo americano ajudam, mas não são capazes de evitar novos problemas.
Valor: Os investidores tendem a colocar muito peso na performance passada das aplicações. Como a atual turbulência afeta as expectativas das pessoas no que se refere a seus investimentos?
Daniel Kahneman: Não tenho certeza se haverá grandes impactos no comportamento do investidor. Os mercados estão atualmente otimistas, por diferentes razões, porque a situação não está tão ruim quanto se esperava. E quando as coisas não vão tão mal quanto se esperava, as ações tendem a subir. Você perguntou se haverá grandes mudanças na forma como as pessoas pensam o mercado acionário e eu acho que é ainda muito cedo para dizer.
Valor: Temos visto os mercados acionários se recuperando rapidamente. Isso pode ser uma bolha?
Kahneman: Você sabe que sou um psicólogo, e acho que, hoje, nem os economistas sabem responder essa pergunta. Houve uma queda grande dos mercados e agora há uma recuperação muito rápida, mas acho que nenhum economista seria capaz de responder a essa pergunta. Alguns economistas conhecidos estão muito pessimistas, mas eles já estavam pessimistas no passado...
Valor: O senhor trabalha na fronteira entre a psicologia e a economia. Quais dificuldades e desafios você enfrenta nesse trabalho?
Kahneman: As finanças comportamentais são uma abordagem da economia muito influenciada pela psicologia, mas não acredito que os mercados são perfeitos ou profundamente racionais. Algumas teorias sobre a percepção do mercado estão completamente erradas. Na minha opinião, um dos mais importantes momentos da crise é o que chamo de "a confissão de Alan Greenspan", quando o ex-presidente do banco central americano disse no Congresso que sua teoria, de que os bancos agem como agentes racionais, estava errada. O fato de essa teoria ter se provado errada levará a maiores precauções na economia por um bom tempo e, no momento, está aumentando a credibilidade das finanças comportamentais.
Valor: Por que esse momento foi o mais importantes da crise?
Kahneman: Não tenho certeza se foi um dos mais importantes momentos para a economia, mas foi importante para seu desenvolvimento intelectual. Alan Greenspan representa aqueles que não acreditam em regulação, que acreditam no mercado, na racionalidade das instituições. A atitude dele, portanto, foi particularmente surpreendente. Ele era claramente a figura mais importante na aplicação dessas teorias.
Valor: Na Teoria da Perspectiva, os investidores se mostram frequentemente irracionais em suas decisões. Na outra ponta, há economistas que acreditam que o mercado é eficiente. Como o senhor vê esses dois pontos de vista nesta crise?
Kahneman: Pelo menos nos Estados Unidos, está claro que houve irracionalidade das pessoas que especularam com imóveis. No que diz respeito à especulação feita pelo bancos, é difícil chamar de irracionalidade, porque os banqueiros já são ricos. A teoria de que bancos ou instituições financeiras podem ser agentes racionais caiu por terra. Não há conexão com o que aconteceu e a Teoria da Perspectiva, mas há a uma ligação direta com as ideias de que o mercado corrige os erros. Os bancos, ou seja, o mercado, amplificaram os erros.
Valor: A crise veio após alguns anos de exuberância. Isso levou os investidores a tomarem mais risco do que estavam preparados?
Kahneman: Não há dúvida disso. O maior desafio ao se tomar risco acontece não porque as pessoas tomam esse risco, mas porque elas não conhecem o risco que estão correndo. Até certo ponto, é o que pode ser ver nesse otimismo irreal. Há uma importante contribuição do livro "Cisne Negro", escrito por Nassim Taleb, antes da crise, mostrando que há sempre mais risco do que as pessoas conhecem. Ele diz que todo evento é maior do que as pessoas pensam, esperam.
Valor: Certa vez o senhor disse que as pessoas seriam melhores investidores se tomassem menos decisões. A atual turbulência mostrou que os indivíduos tendem a comprar na alta e entrar em pânico quando os mercados caem?
Kahneman: É absolutamente o caso. Em geral, quando se observa os fundos de investimento, por exemplo, e as pessoas que investem neles, vê-se que as pessoas compraram no pico. Há um grande número de indivíduos que negociam com o comportamento errado. Está muito claro que, na média, eles fazem isso de forma muito simplista. E quanto menos as pessoas fizerem isso, melhor.
Valor: Alguns dizem que a origem desta crise está no fato de os americanos gastarem mais do que podem e pouparem menos do que deveriam. O senhor concorda?
Kahneman: Isso é um fato. O grau de poupança nos Estados Unidos está historicamente baixa, até negativo nos últimos anos. Estava claro que essa era uma situação insustentável. Talvez não tenha precipitado a crise, mas com certeza foi um dos seus motivos, e não há sinais que isso deve voltar ao normal tão cedo.
Valor: Os reguladores estão ajudando a tornar o sistema financeiro mais frágil ao encorajarem a consolidação dos bancos? Isso pode ser perigoso para os investidores?
Kahneman: Aqui também vou voltar ao meu amigo Taleb. Para ele, a globalização tende a trazer um crescimento muito rápido para as instituições, mas também deixar sua situação mais frágil. Ele diz que nós temos um sistema que é naturalmente robusto, mas a consolidação das instituições contribui para sua fragilidade. Acho que é ingênuo não acreditar nisso.
Valor: As medidas dos governos serão capazes de prever futuros problemas de crédito?
Kahneman: Haverá um ambiente regulatório mais restrito nos EUA por causa da crise. Taleb diz que devem ser tomada as devidas precauções para evitar uma crise como esta. Mesmo assim, não será possível evitar os 'cisnes negros', os eventos imprevistos, mas provavelmente se reduzirá a incidência e amplitude. As medidas podem tornar o sistema mais eficiente. O meu palpite é que haverá uma forte onda regulatória nos EUA, mas se isso vai funcionar ou não está totalmente fora da minha expertise.
Valor: Depois dessa crise, as pessoas mudarão a forma como encaram suas finanças?
Kahneman: Aparentemente, houve um efeito de longo prazo depois da Grande Depressão. As pessoas que viveram nessa época são muito mais inseguras quanto ao futuro. O que estamos vendo agora não é tão severo quanto a Grande Depressão. Acho que as pessoas vão pelo menos pensar um pouco mais, pelo menos por um tempo. Elas terão menos confiança no futuro e provavelmente irão poupar um pouco mais, o que é bom. Claro que, no curto prazo, há um paradoxo, pois poupar agora não é bom para a economia.
Valor: O plano de resgate da economia americana mudará a visão sobre a teorias econômicas?
Kahneman: Haverá algumas mudanças nas teorias, principalmente nas que dizem respeito à estabilidade dos mercados, e isso vai influenciar os governos. Nos EUA, hoje, há uma situação interessante, em que as finanças comportamentais têm uma grande influência na administração de Barack Obama. Particularmente, uma das figuras principais nesse campo (Cass Sunstein) será responsável pelas regulações na Casa Branca. Ele não aceita a tese de que as pessoas são racionais ou o mercado é perfeito. A teoria que influencia o governo irá mudar. Ou melhor, já está mudando.


ARTIGO
Ainda não é hora de países apertarem política fiscalAumento no rendimento dos títulos dos Estados Unidos deve ser encarado de forma positiva, como uma reacomodação do mercado após período de pânico
MARTIN WOLFDO "FINANCIAL TIMES"
SERÁ QUE os EUA (e outros países de alta renda) estão a caminho do apocalipse fiscal? Os recentes saltos nos

Todavia, em um ponto todos concordam: a dívida pública não pode aumentar sem limite
A política está funcionando
Martin Wolf
03/06/2009
É irresponsável insistir num aperto imediato ou em políticas persistentemente frouxas
Estariam os EUA (e alguns outros países de alta renda) rumando para o Armagedon fiscal? Seriam os saltos recentes verificados nas taxas dos bônus uma prova de que os investidores estariam preocupados com as perspectivas fiscais? Minhas respostas a estas questões são: não e não. Isso não quer dizer que não há motivo para se preocupar. Isso tem mais a ver propriamente com o fato de que existem argumentos poderosos contra a redução fiscal neste momento e motivos de peso para saudar iniciativas recentes nos mercados de bônus.
Na semana passada, o "Financial Times" publicou duas colunas que argumentavam que a rota fiscal dos EUA era insustentável, uma de John Taylor da Universidade Stanford e a outra, do historiador de Harvard, Niall Ferguson. Esta última, por sua vez, foi um comentário num debate com o colunista do "New York Times" e prêmio Nobel Paul Krugman, entre outros, no fim de abril.
Em um ponto todos os analistas sérios concordam: a dívida pública não pode aumentar, em relação ao PIB, sem limite. Para empreender um incentivo fiscal no curto prazo, é preciso ser confiável no longo prazo.
Então qual é a discordância? O professor Ferguson apresentou três proposições: primeira, o aumento recente nas taxas dos bônus do governo dos EUA mostra que o mercado de bônus está "desanimando" antes da enorme emissão do governo; segundo, enormes déficits fiscais são desnecessários, e também contraproducentes; e, por fim, há motivos para temer um desfecho inflacionário. Estas são opiniões muito generalizadas. Estariam corretas?
O primeiro ponto, com base na evidência, está errado. O salto nas taxas dos bônus representa uma normalização desejável após um pânico. Os investidores correram para o dólar e para os bônus do governo. Agora eles estão correndo para sair mais uma vez. Seja bem-vindo ao estonteante mundo dos mercados financeiros.
No fim de dezembro de 2008, os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA para dez anos caíram ao nível assustadoramente baixo de 2,1%, ante perto de 4% em outubro. Em parte como resultado desta queda e em parte em função de um surpreendente aumento no rendimento dos bônus protegidos da inflação (Tips), a inflação implícita esperada atingiu um ponto baixo, próximo de zero. O medo da deflação havia se tornado real demais.
O que aconteceu foi um retorno repentino à normalidade: depois de alguma turbulência, o rendimento sobre os bônus convencionais do governo dos EUA fechou em 3,5% na semana passada, enquanto o rendimento sobre o Tips caiu para 1,9%. Portanto, a inflação esperada se nivelou com os objetivos do Federal Reserve, de perto de 1,6%. Praticamente o mesmo aconteceu no Reino Unido, com um aumento na inflação esperada, que foi de um piso histórico de 1,3% em março para 2,3%. O medo do derretimento deflacionário passou. Viva!
É verdade que os spreads entre os bônus convencionais dos EUA e os bônus emitidos pela Alemanha e o Reino Unido se estreitaram. Mas os rendimentos nos EUA foram extraordinariamente deprimidos durante o pânico. A normalidade retorna.
Se até agora não valeu a pena se preocupar com as expectativas inflacionárias, o que dizer das outras preocupações causadas pela enorme emissão de bônus: tomando o espaço dos tomadores de crédito privados? Isso se evidenciaria no aumento das taxas de juros reais. Mais uma vez, as evidências apontam esmagadoramente para o contrário.
O mais recente rendimento do Tips está abaixo de 2%, ao passo que o rendimento dos títulos indexados do Reino Unido está próximo de 1%. Enquanto isso, à medida que crescia o nível de confiança, caiam os spreads entre bônus corporativos e títulos do Tesouro dos EUA. Também é possível usar as estimativas da inflação esperada derivada dos bônus governamentais para estimar as taxas de juro reais sobre os bônus corporativos. Elas também caíram acentuadamente. Apesar de os bônus de maior risco renderem atualmente mais do que há dois anos, eles rendem muito menos que no fim de 2008. Isso também é uma notícia muito boa.
Agora voltemos à política fiscal. O argumento proposto pelos oponentes é que a política fiscal é sempre desnecessária e ineficaz ou, como sugere o professor Ferguson, ela é redundante, pois esta não é uma "Grande Depressão". Os monetaristas argumentam que a política fiscal é sempre desnecessária, já que a expansão monetária dá conta do recado. Economistas que acreditam na "equivalência ricardiana" - em homenagem ao economista do começo do século 19, David Ricardo - argumentam que a política fiscal é ineficaz, pois as famílias compensarão qualquer redução na poupança do governo com suas próprias economias mais altas.
Os economistas discordam intensamente em torno destes pontos. Minha abordagem é "keynesiana": em ocasiões extremas, o excesso de economias desejadas em relação ao investimento dispara. Mais uma vez, a política monetária, embora importante, torna-se menos eficaz quando as taxas de juros são zero. É sensato, pois, colocar o cinto monetário e também os suportes fiscais.
Uma recessão profunda comprova que existe um enorme aumento na poupança excedente desejada com pleno emprego, como argumenta o professor Krugman. No momento, portanto, os déficits fiscais não estão dificultando as emissões do setor privado. Pelo contrário, estão facilitando as emissões, apoiando a demanda, que sustenta os postos de trabalho e os lucros.
Ferguson argumenta que a expansão fiscal foi desnecessária porque esta é apenas uma recessão branda. A questão, porém, é por que esta recessão é apenas branda, já que os sinais precursores de uma depressão estavam certamente presentes.
A resposta, em parte, é as políticas monetárias agressivas dos bancos centrais e o socorro do sistema financeiro. Mas será que isso é tudo? O que teria acontecido se os governos tivessem decidido reduzir despesas e elevar impostos? Pode-se discordar de quanto de afrouxamento fiscal deliberado foi necessário. Mas um dos motivos mais importantes que explicam porque esta não é a Grande Depressão é que aprendemos uma lição então, e no Japão na década de 1990: não apertem a política fiscal cedo demais. Além disso, economias historicamente bem administradas certamente são capazes de aguentar níveis mais altos de endividamento público muito confortavelmente.
Isso, então, nos leva à última preocupação: o medo da inflação. Esta é essencialmente a questão de como sair das políticas extremas atuais. As pessoas precisam acreditar que as políticas monetárias e fiscais extraordinariamente agressivas de hoje serão revertidas. Se elas não acreditarem nisso, poderá até ocorrer uma enorme elevação nas expectativas inflacionárias muito antes de a economia mundial se recuperar. Se isso acontecesse, os formuladores de política ficariam presos num aperto doloroso e o mundo realmente poderia acabar experimentando uma estagflação ao estilo dos anos de 1970.
As políticas excepcionais usadas para lidar com circunstâncias extremas estão funcionando. Agora, como resultado, os formuladores de política andam sobre uma corda bamba: por um lado, estão a retirada prematura e um retorno à recessão profunda; do outro lado, as expectativas inflacionárias galopantes e a estagflação. É irresponsável insistir num aperto imediato ou em políticas persistentemente frouxas. Tanto os EUA como o Reino Unido correm o risco desta última. Mas seus críticos se arriscam a cometer um erro igual e oposto. A resposta é clara e também complicada: optem por um duro aperto, mas ainda não.
Martin Wolf é colunista do "Financial Times".



Reagan Didn't Do It
By Robert Scheer
June 3, 2009
Robert Scheer is the editor of Truthdig, where this article originally appeared. His latest book is The Pornography of Power: How Defense Hawks Hijacked 9/11 and Weakened America(Twelve).
How could Paul Krugman, winner of the Nobel Prize in economics and author of generally excellent columns in the New York Times, get it so wrong? His column last Sunday--"Reagan Did It"--which stated that "the prime villains behind the mess we're in were Reagan and his circle of advisers," is perverse in shifting blame from the obvious villains closer at hand.
It is disingenuous to ignore the fact that the derivatives scams at the heart of the economic meltdown didn't exist in President Reagan's time. The huge expansion in collateralized mortgage and other debt, the bubble that burst, was the direct result of enabling deregulatory legislation pushed through during the Clinton years.
Ronald Reagan's signing off on legislation easing mortgage requirements back in 1982 pales in comparison to the damage wrought fifteen years later by a cabal of powerful Democrats and Republicans who enabled the wave of newfangled financial gimmicks that resulted in the economic collapse. Reagan didn't do it, but Clinton-era Treasury Secretaries Robert Rubin and Lawrence Summers, now a top economic adviser in the Obama White House, did. They, along with then-Fed Chairman Alan Greenspan and Republican congressional leaders James Leach and Phil Gramm, blocked any effective regulation of the over-the-counter derivatives that turned into the toxic assets now being paid for with tax dollars.
Reagan signed legislation making it easier for people to obtain mortgages with lower down payments, but as long as the banks that made those loans expected to have to carry them for thirty years they did the due diligence needed to qualify creditworthy applicants. The problem occurred only when that mortgage debt could be aggregated and sold as securities to others in an unregulated market.
The growth in that unregulated OTC market alarmed Brooksley Born, the Clinton-appointed head of the Commodity Futures Trading Commission, and she dared propose that her agency regulate that market. The destruction of the government career of the heroic and prescient Born was accomplished when the wrath of the old boys club descended upon her. All five of the above mentioned men sprang into action, condemning Born's proposals as threatening the "legal certainty" of the OTC market and the world's financial stability.
They won the day with the passage of the Commodity Futures Modernization Act, which put the OTC derivatives beyond the reach of any government agency or existing law. It was a license to steal, and that is just what occurred. Between 1998 and 2008, the notational value of the OTC derivatives market grew from $72 trillion to a whopping $684 trillion. That is the iceberg that our ship of state has encountered, and it began to form on Bill Clinton's watch, not Reagan's.
How can Krugman ignore the wreckage wrought during the Clinton years by the gang of five? Rubin, who convinced President Clinton to end the New Deal restrictions on the merger of financial entities, went on to help run the too-big-to-fail Citigroup into the ground. Gramm became a top officer at the nefarious UBS bank. Greenspan's epitaph should be his statement to Congress in July 1998 that "regulation of derivatives transactions that are privately negotiated by professionals is unnecessary." That same week Summers assured banking lobbyists that the Clinton administration was committed to preventing government regulation of swaps and other derivatives trading.
Then-Rep. Leach, as chairman of the powerful House Banking Committee, codified that concern in legislation to prevent the Commodity Futures Trading Commission or anyone else from regulating the OTC derivatives, and American Banker magazine reported that the legislation "sponsored by Chairman Jim Leach is most popular with the financial services industry because it would provide so-called legal certainty for swaps transactions. ... "
Legal certainty for swaps--meaning the insurance policies of the sort that AIG sold for collateralized debt obligations without looking too carefully into what was being insured and, more important, without putting aside reserves to back up the policies in the case of defaults--is what caused the once respectable company to eventually be taken over by the US government at a cost of $185 billion to taxpayers.
Leach, an author of the Gramm-Leach-Bliley Act, which allowed banks like Citigroup to become too big to fail, is now a member of the board of directors of ProPublica, which bills itself as "a non-profit newsroom producing journalism in the public interest." Leach serves as the chair of a prize jury that ProPublica has created to honor "outstanding investigative work by governmental groups," and perhaps he will grant one retrospectively to Brooksley Born and the federal commission she ran so brilliantly before Leach and his buddies destroyed her.

About Robert ScheerRobert Scheer, a contributing editor to The Nation, is editor of Truthdig.com and author of The Pornography of Power: How Defense Hawks Hijacked 9/11 and Weakened America (Twelve) and Playing President (Akashic Books). He is author, with Christopher Scheer and Lakshmi Chaudhry, of The Five Biggest Lies Bush Told Us About Iraq (Akashic Books and Seven Stories Press.) His weekly column, distributed by Creators Syndicate, appears in the San Francisco Chronicle. more...



Capa: Há dois anos, a forte contração do crédito escancarava a gravidade da crise financeira e renovava o interesse pelas ideias de um dos mais importantes economistas americanos.
A Presença de Minky
Por Márcia Pinheiro, para o Valor, de São Paulo
31/07/2009
Imagine-se o mundo sem bancos centrais. Sem o Federal Reserve. Não haveria políticas monetárias. Não teria havido Alan Greenspan, que não teria mantido os juros baixos por um tempo talvez excessivo. Wall Street não teria feito a festa especulativa que fez. Não teria acontecido o grande "boom" imobiliário americano, nem a crise dos empréstimos "subprime". E Hyman Philip Minsky (1919-1996) não teria o que fazer, com seus escritos, como explicador da desestabilização financeira que virou a economia global de pernas para o ar. Não se teria falado, portanto, em "Momento Minsky", como ficou conhecido aquele ponto em que se dá a virada da bonança em mercados financeiros movidos a crédito fácil para o pânico em que ninguém quer emprestar para ninguém e os ativos passam a valer tanto quanto pó. O fato é que em agosto, mesmo que muita gente admiradora dos mercados absolutamente livres fique contrariada, não faltará quem lembre que, nesse mês, em 2007, o Momento Minsky estava em sua plena exposição de realidade keynesiana.
O mês é o de preferência de Paul McCulley, diretor-gerente da Pacific Investment Management Company (Pimco), que criou a expressão Momento Minsky em 1998, durante a crise da dívida russa. Mas ele admite que também se poderá encontrar o Momento Minsky um tanto antes ou depois. O economista André Luís Cabral de Lourenço, professor da UFRN, estudioso da Hipótese de Instabilidade Financeira, desenvolvida por Minsky, acha que agosto de 2007, quando a crise se tornou mais evidente, com violenta contração do crédito, pode ser uma escolha, mas também entende que se podem ver vários Momentos Minsky e que talvez seja mais apropriado falar em um contexto ou em um cenário Minsky (ver pág.14).
Depois de anos em que suas ideias tiveram pouco destaque, Minsky voltou a ser mencionado em artigos e conferências. Recentemente, durante o seminário "Bancos Públicos - Financiamento ao Desenvolvimento e Regulação Bancária", organizado pelo Valor, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, também professor da Unicamp, citou Minsky várias vezes, ao comentar as origens e os desdobramentos da crise financeira americana, e defender a ampliação dos poderes dos bancos centrais e da regulamentação geral dos sistemas financeiros como forma de evitar a formação e a expansão de bolhas especulativas, até onde possível (a propósito: Minsky não via a ação estatal como capaz de estabilizar definitivamente a economia capitalista).
Sergio Lima / Folha
Barbosa, da Fazenda: o grande mérito dos economistas agora lembrados foi trazer as questões do conflito distributivo de volta à pauta das políticas públicas
Minsky é um dos pensadores mais caros aos economistas não ortodoxos. Nascido em Illinois, obteve graduação em Ciências na Universidade de Chicago, mestrado e doutorado em administração pública em Harvard, onde foi discípulo de Joseph Schumpeter e Wassily Leontief. Ensinou nas universidades Brown, da Califórnia e Washington. Aposentado em 1990, continuou a escrever e a lecionar no Levy Economics Institute. Do mestre Keynes, Minsky fez uma releitura criativa em seu livro "John Maynard Keynes" (1975), no qual propõe uma nova interpretação de questões relacionadas ao investimento, de inspiração keynesiana, mas com maior ênfase nos fatores determinantes de caráter financeiro. É nesse livro, aliás, segundo Lourenço, que ganham maior consolidação as bases teóricas essenciais da Hipótese de Instabilidade Financeira desenvolvida por Minsky.
Em outro economista americano também "redescoberto" por causa da crise, Irving Fisher (1867-1947), contemporâneo e amigo de Keynes (que o chamou de "bisavô" de suas próprias ideias), não é difícil encontrar similaridades com as análises de Minsky a respeito da instabilidade financeira que seria inerente ao sistema capitalista. Um pouco mais distante, mas também sugerindo premissas a Minsky, está o polonês Michal Kalecki (1899-1970).
Anna Carolina Negri / Valor
Coutinho, do BNDES, toma Minsky como paradigma teórico para defender ampliação do poder dos bancos centrais e da regulamentação dos sistemas financeiros
Minsky começou a frequentar as colunas de formadores de opinião, com mais assiduidade, no ano passado. Em setembro de 2008, Martin Wolf, o principal comentarista econômico do "Financial Times", sustentou que Minsky sempre esteve certo em sua análise da instabilidade da economia. "Um longo período de rápido crescimento e juros e inflação baixos levaram a grande complacência e vontade crescente de se tomar riscos", escreveu Wolf.
Minsky foi um seguidor "fenomenal" de Keynes na área macroeconômica, segundo Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. O argumento mais importante de Minsky, que revela toda sua atualidade, é "a concepção do processo de fragilização dos sistemas financeiros", diz Fernando Cardim de Carvalho, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Para Minsky, as distorções que engendram crises são geradas espontaneamente pelos mercados, mais especialmente nos períodos de maior prosperidade.
É a "estabilidade instável". Ou seja, a experiência de estabilidade faz com que os agentes privados se tornem complacentes e diminuam as margens de segurança em suas transações, expondo-se cada vez mais a riscos. Por isso, até mesmo um pequeno choque é suficiente para fazer o castelo de cartas desmoronar. "Uma dimensão central dessa complacência é a disposição de se expor ao risco dos juros, fazendo dívidas de curto prazo para a aplicação em ativos de longo prazo, com ganhos nos 'spreads' da curva de rendimentos", diz Carvalho. Está dada a receita do colapso: com o aumento da alavancagem, mesmo pequeno choques adversos são fatais.
O grande mérito desses pensadores - Keynes, Minsky, Fisher, Kalecki - foi trazer de volta o conflito distributivo à pauta das políticas públicas, afirma Barbosa, da Fazenda. Houve uma revitalização da economia política. "Não basta controlar a inflação. Passou-se a discutir não se o Estado deveria investir, mas quanto", diz o secretário.
Barbosa bate na tecla que não há modelo único. "Os arranjos possíveis são múltiplos. Claro que nem todos são de equilíbrio. Mas não é possível mais pensar que exista só um PIB potencial ou um determinado nível de juros."
Conselheiro informal do presidente Lula, Luiz Gonzaga Belluzzo diz que a obra de todos esses economistas constitui o repertório anticíclico. "Há a percepção de que a economia capitalista se move em torno de um mercado complexo e a ação pública é redutora da complexidade", afirma. Belluzzo não descarta que o pensamento conservador ressuscite, por ter uma plateia numerosa e influente. "São os mesmos que em crises bradam para que sejam salvos pelo Estado."
A tendência de recuperação do papel do investimento público foi nítida desde a primeira gestão do presidente Lula. "Não se limita à política anticíclica, mas estrutural", alerta Belluzzo. Por muito tempo, esse papel no Brasil foi desempenhado pelas estatais. Hoje, o orçamento é a ferramenta principal. "É um equívoco sustentar que o investimento público afugenta o privado. São complementares. Em vez do 'crowding out', deveria prevalecer o 'crowding in' keynesiano."
Leda Paulani, professora da Universidade de São Paulo (USP), vai mais longe. Além de Keynes, ela diz que houve uma necessária, ainda que tardia, revisita aos escritos de Karl Marx. Não por acaso, "O Capital" foi reeditado na Alemanha e rapidamente sumiu das prateleiras. É de Marx a constatação de que a economia capitalista se move por crises.
O pensamento de Marx não é para se por em prática. É um instrumental de análise. Seus textos são excelentes fontes para o diagnóstico de como as situações de crise são geradas, diz Paulani. Já Keynes e Minsky são um prato cheio para os administradores públicos, por não economizarem em receitas de políticas econômicas, para manter o pleno emprego de recursos, com o controle das atividades financeiras.
A professora diz que a redescoberta desses autores, tão benquistos pelos economistas denominados desenvolvimentistas, não deveria causar espanto. "Os Estados Unidos praticam o keynesianismo há uma década. As medidas de [Barack] Obama apenas explicitaram o caráter intervencionista do governo americano na economia." Segundo Leda, no Brasil, as pontas mais visíveis do pensamento do autor da "Teoria Geral" são o Programa de Aceleração Econômica (PAC) e o pacote de estímulo à construção, pelo forte efeito multiplicador no nível de emprego.
Para Simão Silber, da Universidade de São Paulo (USP), seguidor de outras paragens conceituais, o grande nome pouco lembrado atualmente é Irving Fisher, que tem uma explicação alternativa à de Keynes sobre a crise. "Ele explica a crise pela deflação de ativos e aumento real das dívidas." Mesmo com juros nominais próximos de zero, a crise de crédito manifestou-se abertamente nos Estados Unidos 2008, da mesma forma que em 1933.
De acordo com Silber, ao contrário do cardápio keynesiano, o fisheriano sustenta que de nada vale a política fiscal. A ordem para evitar o pior é não deixar os preços caírem, sanear o sistema financeiro e reduzir dramaticamente a concessão de crédito, para que a recessão não se aprofunde.
Alargando o leque da literatura, Barbosa, da Fazenda, reintroduz os autores que fizeram a ponte entre a economia e a psicologia. Seus favoritos são Herbert Simon, Daniel Kanehman, Robert Shiller e Matthew Rabin, que, grosso modo, defendem que a rotina da satisfação pode superar, na dinâmica da economia, a maximização do lucro. "Não há mais o predomínio das expectativas racionais. Os objetivos hoje são fundamentalmente do bem-estar aliado às decisões econômicas."
Belluzzo enxerga algum avanço, mas não muito, no governo Lula em direção às políticas não neoliberais. No primeiro mandato, houve uma sensível redução da vulnerabilidade externa do país, "ajudada pelas mudanças estruturais no mundo". Segundo o economista, o trabalho "foi muito bem feito e até o conservadorismo do Banco Central contribuiu para a maior solidez".
As políticas sociais compensatórias, como o Bolsa Família, foram outro grande passo adiante, na visão de Belluzzo. Ele nota que tais práticas foram criticadas tanto pela direita como pela esquerda, uma vez que, para estes últimos, somente a criação maciça de empregos resolveria a questão social. Por fim, com o PAC, vê-se uma recuperação do papel do investimento público.
Em que pese a volatilidade do "in and out", sobe e desce, quando se trata de economia, o fato é que os pensadores contemporâneos estão mais afeitos a políticas que combinem o que de melhor a história do pensamento econômico produziu. Atualmente, há um outro consenso latente, ainda sem nome, uma vez que governos e instituições multilaterais têm convergido para uma visão mais intervencionista e menos ideológica a respeito das virtudes do mercado.
Hoje, a bíblia é outra: "Uso mais agressivo de políticas fiscais para sustentar a demanda agregada, lançar mão de meios não convencionais para expandir a liquidez da economia e endurecer a regulação financeira, pois a hipótese dos mercados eficientes, tão cara ao pensamento mais ortodoxo, levou ao desastre", sintetiza Cardim, da UFRJ. Do lado neoclássico, dito ortodoxo, afirma-se o contrário: a crise aconteceu por que o governo americano, via Fed, interferiu no que seria a dinâmica natural dos mercados, facilitando a especulação e a expansão da grande bolha financeira.
O fato é que boa parte das posições reformistas têm-se originado nos Estados Unidos, o que não é pouca coisa. Ainda vai demorar para o mundo assistir ao decantado declínio do império americano. Profecia improvável, aliás. O país continua a ser o paradigma fundamental quando o assunto é economia, para o bem ou para o mal.

Domenico Delli Gatti - Microfoundations for the Vision of Minsky




Keen Behavioural Finance 2011 Lecture01 Economic Behaviour Part 1




Keen Behavioural Finance 2011 Lecture04 Economic Behaviour Part 1




De repente, um momento de provação para o capitalismo
Cyro Andrade, de São Paulo
31/07/2009
Belluzzo: "Há a percepção de que a economia capitalista se move em torno de um mercado complexo e a ação pública é redutora da complexidade"
É regra essencial do capitalismo: sem risco não há recompensa. Mas pode haver momentos em que ninguém quer correr riscos. É quando os mercados param. É o capitalismo em transe. É um "Momento Minsky". Nesse instante, os preços dos ativos, inflados por especulação levada a extremos de risco, até então abrigada numa bolha que parecia não conhecer limites de expansão, desabam, tornando imperiosa a desalavancagem. É a hora do pânico. Tempos de ganhos fáceis, que pareciam estabelecidos em absoluta perenidade, ficam para trás.
Hyman Philip Minsky explica essa transição cíclica da bonança para o desastre com sua Hipótese da Instabilidade Financeira (HIF), constituída por estas proposições principais, listadas pelo economista André Luís Cabral de Lourenço em artigo que escreveu em 2005 ("O pensamento de Hyman Minsky: Alterações de percurso e atualidade"): (1) uma economia capitalista que possui um sistema financeiro sofisticado, complexo e em contínua evolução alterna períodos de comportamento estável com períodos turbulentos/caóticos: (2) esses comportamentos são endógenos à economia capitalista, pois decorrem da busca de interesses próprios pelos agentes e podem ser gerados mesmo a partir de situações de estabilidade; (3) os períodos turbulentos/caóticos podem assumir a forma de inflações interativas, bolhas especulativas ou deflações de débitos inter-relacionadas; (4) à medida que essas turbulências se estabelecem, vão adquirindo movimento próprio, que, porém, tenderá a ser revertido (por restrições colocadas por instituições, por políticas que afetem a estrutura institucional ou mesmo por autoorganização dos mercados); (5) surgem, assim, condições propícias à emergência de um novo regime de estabilidade; (6) é provável que esse novo regime se caracterize por baixo nível de atividade econômica, mas a busca do interesse próprio pelos agentes acabará por gerar um novo ciclo expansivo, acompanhado de nova onda especulativa; (7) com o passar do tempo, novos regimes de expansões incoerentes e contrações desastrosas se sucederiam.
Minsky se orientava, no dizer de Lourenço, por "um princípio organizador, uma visão pré-analítica", que fazia a ponte de sua identificação com a essência do pensamento de Keynes. Para Minsky, "a economia de Wall Street" - correspondente às forças financeiras mostradas por Keynes em interação com a produção e o consumo para determinar o produto, o emprego e os preços - explicaria tudo, inclusive a instabilidade do sistema capitalista.
Bloomberg
McCulley, da Pimco, acha que o "Momento Minsky" aconteceu em agosto de 2007, mas, como Cabral de Lourenço, também vê possíveis ocorrências tanto antes, como depois
Na crise financeira nascida dos excessos de especulação nos Estados Unidos, quando se dá o Momento Minsky?
Paul McCulley, diretor-gerente da Pacific Investment Management Company (Pimco), que inventou a expressão quando da crise da dívida russa, em 1998, acha que foi em agosto de 2007. No dia 9, o medo paralisou os mercados de crédito no mundo, como se viu quando o BNP Paribas, terceiro maior banco francês, anunciou que suspendia o resgate de três fundos por que não conseguia avaliar o preço dos seus ativos.
Ao Valor, Lourenço disse que, "mais importante que datar com precisão o início da crise é lembrar que, para Minsky, esta é apenas a manifestação ruidosa de um silencioso (e muito antecedente) processo de fragilização financeira". Este seria um fenômeno recorrente na história da economia mundial, que se desenvolveria nas fases de expansão do ciclo de negócios que comumente antecede a crise. "É claro que vários elementos específicos podem ter transformado o que seria uma crise cíclica 'normal' em uma crise aparentemente mais pronunciada: a desregulamentação financeira (ativa e passiva), as inovações financeiras associadas à securitização das hipotecas, as políticas empregadas no tratamento da bolha financeira anterior, e assim por diante. Todos esses elementos constituem, por assim dizer, 'momentos Minsky'. Então, talvez fosse mais apropriado falar em um 'contexto' ou em um 'cenário Minsky', cuja construção, alicerçada nesses elementos, foi obra de anos."
No lado não keynesiano do pensamento econômico afirma-se que, ao contrário do que o modelo de Minsky pode sugerir, não há nada de errado com o capitalismo. O que não dá certo, e provoca situações de crise como a originária do fabuloso "boom" hipotecário americano, é a ingerência do governo, através, por exemplo, de políticas monetárias lenientes, como a praticada pelo Fed de Alan Greenspan.
Na verdade, explica Lourenço, "no campo liberal, à direita, acredita-se que as crises financeiras refletiriam comportamentos privados distorcidos pela expectativa de ação estatal". Ou seja, "a expectativa de que o Estado salvaria as empresas financeiras em caso de crise as levaria a agir de forma distorcida, anormalmente imprudente, descuidando da análise de riscos e se excedendo na concessão de crédito, na expectativa de obterem maiores lucros". A crise seria, afinal, uma manifestação da inconsistência de tais ações e, na ausência da expectativa de socorro do Estado, tais anomalias - e, portanto, a crise - não ocorreriam. "A solução definitiva para todas as crises financeiras estaria, então, na abstenção de ações de salvamento por parte do Estado, mesmo que ao custo de permitir que a presente crise avançasse ainda mais. Isso por que, em seu caráter supostamente salutar, a crise ensinaria aos agentes econômicos que eles deveriam seguir outro padrão de comportamento, compatível, em tese, com um crescimento econômico estável."
No campo heterodoxo, mais à esquerda, no qual Minsky se situa, a leitura é bem outra. A crise, "entre outros males econômicos", explica Lourenço, constituiria o resultado normal do funcionamento anárquico e inconsistente da economia capitalista liberal, que o mero funcionamento do sistema de preços não seria capaz de solucionar. As empresas não agiriam de forma imprudente por causa apenas da expectativa de ação salvadora do Estado. O próprio sucesso das fases de crescimento, com seus lucros polpudos, "pavimentaria o caminho para o desastre, com a excitação das expectativas e a opção por atitudes financeiras mais agressivas e arriscadas, que explicariam as loucuras financeiras que acompanham a formação das bolhas especulativas e desembocam em crises". Assim, "já que a causa da crise residiria na própria lógica do lucro privado, a abstenção de ação salvadora pelo Estado não seria remédio adequado. Poderia, ao contrário, desestabilizar ainda mais as expectativas e tornaria as crises financeiras mais virulentas e socialmente perversas - e, no limite, mataria o paciente."
Ao contrário de outros economistas de esquerda, lembra Lourenço, Minsky não vê a ação estatal como capaz de estabilizar definitivamente a economia capitalista (que seria inerentemente instável), já que a raiz da instabilidade repousaria na coração do sistema, a lógica do lucro. Qualquer ação estabilizadora teria eficácia temporária, apenas evitando o aprofundamento da crise. "Pior, carregaria em si a semente das crises financeiras futuras, na medida em que não somente sinalizaria um ambiente mais estável para os agentes privados - o qual tende por si só a ganhar mais instabilidade - mas também aumentaria a munição disponível para uso no cassino das apostas especulativas, soprando bolhas futuras, por assim dizer."
A única terapia com mais chance de sucesso - e mesmo assim também temporária - seria uma regulamentação financeira mais forte, que atuasse de forma preventiva, tentando evitar os exageros especulativos. Se essa intervenção der certo, crises financeiras mais severas poderão ser evitadas, tornando desnecessária a ação de salvação financeira direta pelo Estado. "Minsky aponta, porém, a possibilidade de a regulação tornar-se periodicamente insuficiente, pois sua própria existência tende a incentivar a busca, pelas instituições financeiras, de inovações capazes de contorná-la. O cenário, portanto, seria de uma incessante corrida entre a norma do regulador e inovação do regulado, na qual, sempre que o regulado conseguisse abrir muita vantagem, a estabilidade econômica seria posta em risco. Existe também a possibilidade de o regulado ser politicamente poderoso, a ponto de conseguir controlar o regulador."
Essa experiência de cooperação e confronto, ao mesmo tempo, vai entrando em nova fase nos Estados Unidos e outros países centrais, com ensaios de regulamentação mais restritiva. Começa aí o que poderá ser, então, um novo campo aberto à avaliação das qualidades empíricas das ideias de Hyman Minsky.




Há cada vez mais influência da política sobre o desempenho dos mercados
Capitais de capital
Ian Bremmer09/06/2009
Há cada vez mais influência de fatores políticos sobre o desempenho dos mercados mundiais
O governo chinês anunciou recentemente desejar que até 2020 Xangai torne-se uma capital financeira mundial igual a Londres e Nova York. Um objetivo ambicioso, que poderá ou não ser alcançado. Mas as aspirações chinesas também evidenciam uma nova realidade preocupante e cada vez mais generalizada: autoridades políticas estão tomando decisões em escala não vista em décadas, normalmente deixadas ao sabor dos mercados.
Assim como a própria crise financeira, essa tendência é agora mundial. Líderes políticos em dezenas de países estão tomando decisões que nortearão o desempenho de mercados locais e mundial num futuro previsível.
Na China, as exportações caíram mais de 25% em fevereiro. Não há razões para preocupação, disse o premiê Wen Jiabao - o governo chinês tem "munição adequada" para acrescentar a seu pacote de estímulo de US$ 586 bilhões, um plano com o objetivo de criar milhões de empregos mediante enorme investimento governamental em transportes, energia, infraestrutura, habitação e outros projetos de larga escala.
Na Índia, onde o governo é mais frequentemente considerado um obstáculo ao comércio do que um catalisador de crescimento, é agora mais provável que as decisões que infuenciam mercados locais venham de Nova Déli do que de inovadores em Bombaim. De fato, o governo, comandado do Partido do Congresso, empenhado em parecer sensível à demanda da sociedade por ajuda durante um desaquecimento econômico em ano eleitoral, criou três pacotes de estímulo desde dezembro.
Em última instância, para identificar como, quando e onde ativos serão alocados, e como riqueza será gerada em dezenas de países em todo o mundo desenvolvido e em desenvolvimento atualmente, devemos agora considerar capitais políticos, e não financeiros.
Essa tendência promete problemas para o crescimento econômico mundial no longo prazo. Em primeiro lugar, já é bastante difícil para líderes na elite do Partido Comunista Chinês elegerem um consenso sobre prioridades de política econômica. Os obstáculos com que se defronta o presidente americano Barack Obama, ao tentar conseguir, de democratas divergentes e republicanos obstinados, apoio a opções arriscadas e dispendiosas de política governamental criarão algumas barganhas legislativas torturantes.
Esse padrão está se repetindo em outros países. Na Rússia, Ucrânia, Hungria, Paquistão, Turquia, Malásia, México, Nigéria e outros países, choques de facções políticas internas com frequência produzirão reações incoerentes frente a problemas econômicos prementes.
Em segundo lugar, se é difícil pactuar um consenso no cenário de um só país sobre como melhor estimular o crescimento, imagine o mesmo argumento em escala mundial. A maioria dos políticos formula políticas para atender sua base de apoio local e resguardar seu capital político pessoal. Revitalizar o crescimento mundial fica em distante segundo lugar.
Em Washington, muitos democratas aproveitarão esses debates sobre políticas de governo para capitalizar a fúria popular contra Wall Street, ao passo que muitos republicanos procuram uma abertura para capitalizar uma esperada ira pública contra os democratas. Alguns quadros na liderança do Partido Comunista Chinês apoiarão planos para formular uma mudança - de crescimento puxado por exportações para um modelo baseado em consumo interno. Outros tentarão direcionar recursos estatais para seus projetos de investimento pessoais. Facções nos governos da Rússia, Índia, México e África do Sul têm suas próprias prioridade políticas conflitantes.
Em vista de tantas autoridades políticas formulando reações à crise para solucionar problemas locais ou para criar oportunidades locais, qual a probabilidade de consenso em torno de uma abordagem internacional unificada?
Nosso primeiro vislumbre dos problemas em coordenar uma resposta internacional à crise financeira foi em novembro passado, durante a cúpula emergencial do G-20 em Washington. Conseguir um consenso sobre prioridades no âmbito do G-8 já é bastante complicado; construir um consenso no G-20 é exponencialmente mais difícil, não simplesmente devido ao maior número de participantes envolvidos, mas porque muitos deles não concordam sobre as regras mais básicas do jogo econômico mundial.
Embora a cúpula do G-20 em Londres em abril tenha produzido mais acordo do que esperado em torno de política econômica, isso foi em larga medida porque a questão mais conflituosa - a exigência americana e britânica de mais gastos mundiais em estímulo econômico - foi suprimida previamente da mesa de negociações. Por essa razão, os sorridentes presidentes e primeiros-ministros puderam dar-se ao luxo de serem mais diplomáticos do que o primeiro-ministro tcheco, Mirek Topolanek, que, em seu papel de presidente em exercício da União Europeia (UE), advertira que o plano econômico de Obama arrastaria outros países para uma "estrada até o inferno".
Topolanek não esteve na reunião do G-20; seu país não é membro do grupo. E embora o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, concorde com Obama em que os principais países industrializados do mundo precisam estimular suas economias nacionais na medida em que puderem, o presidente do Banco da Inglaterra, Mervyn King, advertiu que o Reino Unido pode já ter assumido dívidas demais para poder embarcar em outra rodada de estímulo.
Por mais assustadora que seja a recessão mundial, uma reação coordenada e coerente a ela por parte dos líderes políticos mundiais continua, na melhor das hipóteses, extremamente incerta. E a cada vez mais forte influência de fatores políticos sobre o desempenho dos mercados provavelmente influenciará o crescimento mundial por muitos anos.
Ian Bremmer é presidente do Eurasia Group e membro sênior do World Policy Institute. © Project Syndicate/Europe´s World, 2009. http://www.project-syndicate.org/




A discussão ultrapassa a esfera ideológica
Custeio e investimento: o que sabemos?
Alexandre Manoel Angelo da Silva e José Oswaldo Cândido Júnior 09/06/2009
Sugerir a troca de custeio por investimento é obviamente mais fácil recomendar do que implementar
A preocupação com os efeitos macroeconômicos dos gastos públicos (custeio e investimento) é um tema que engloba uma extensa literatura. Nesse sentido, apesar de existir uma sabedoria convencional de que há superioridade absoluta do investimento público em relação ao custeio, no que diz respeito a um suposto impacto positivo sobre o produto daquele e um impacto negativo deste, afirmamos que, de maneira geral, do ponto de vista teórico, ainda não há consenso a respeito dessa superioridade nem no curto, nem no longo prazo. De fato, dependendo da forma como se modela a função de produção, obtêm-se performances positivas ou negativas do investimento público ou do custeio sobre o produto.
A título de ilustração, autores renomados da literatura de crescimento econômico, tais como Robert Barro, consideram alguns tipos específicos de gastos de custeio como produtivos. Em particular, aqueles bens providos publicamente sujeitos a congestionamento (gastos na manutenção dos serviços de abastecimento de água e esgoto sanitário, no Judiciário e na segurança pública) e gastos que contribuem para o acúmulo de capital humano (gastos com educação e treinamento). Notem que, no conceito de contas nacionais, a maioria desses gastos é alocada como consumo (custeio) do governo e poderia (pela sabedoria convencional) ter sua elevação entendida como prejudicial ao crescimento econômico, quando, de acordo com a modelagem de Barro, essa mesma elevação afetaria positivamente a produtividade dos fatores de produção.
Por sua vez, há autores, como Lant Pritchett, que apontam muitas evidências empíricas de investimentos que são considerados "elefantes brancos", isto é, investimentos públicos que não ampliam a capacidade produtiva da economia. Há, também, autores como Devarajan, Swaroop & Heng-fu que destacam a importância dos efeitos marginais dos gastos públicos, indicando que uma expansão acentuada de determinado tipo de gasto considerado produtivo pode vir a torná-lo improdutivo, ou seja, a produtividade do gasto depende do seu nível e composição que afetam os seus efeitos marginais.
Diante desse quadro teórico não consensual relativo aos efetivos impactos do gasto público (custeio e investimento) sobre o produto, é natural que muitos economistas sejam céticos e prefiram avaliar empiricamente os efeitos macroeconômicos dos gastos públicos, sem atribuir a priori uma superioridade para os investimentos públicos. Entre tantas outras estratégias de economistas que se debruçaram sobre esse tema ao redor do mundo, essa foi a adotada por Perotti (Perotti, R. (2004). "Public Investment: Another (Different) Look". University of Bocconi) e Mittnik & Neumann (Mittnik, S. and T. Neumann. (2001). "Dynamic Effects of Public Investment: Vector Autoregressive Evidence from Six Industrialized Countries", Empirical Economics 26, 429-446). Também foi essa estratégia que adotamos em Texto de Discussão a ser publicado pelo Ipea, sob o título "Impactos Macroeconômicos dos Gastos Públicos na América Latina".
Em nosso caso, avaliamos os impactos macroeconômicos dos principais componentes dos gastos públicos (consumo e investimento) sobre o PIB, consumo das famílias e investimento privado, em uma amostra de seis países da América Latina. Os países escolhidos foram Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Venezuela no período de 1970-2003. Trata-se de estudo eminentemente exploratório (de dados) do ponto de vista econométrico, que formalmente não testa qualquer modelo teórico.
No caso específico do Brasil, no longo prazo, encontramos uma relação negativa entre o consumo do governo (custeio) e o produto e, pela ausência de cointegração, não foi possível observar a relação entre investimento público e produto. Contudo, no curto prazo, não obtivemos superioridade do investimento público, sendo, pois, indiferente para o governo utilizar custeio ou investimento público para recuperar a atividade econômica no curto prazo, ao contrário do que a sabedoria convencional aponta.
Destaque-se também que, ao se analisar os resultados de todos os países investigados em nossa pesquisa, concluímos que o efeito do custeio sobre o produto depende do nível e da forma como o custeio evolui na margem. Em outras palavras, o espaço fiscal permitido para ampliar os gastos de custeio parece depender da forma como evolui a seguinte relação: nível de consumo governamental sobre investimento público. Em países que essa relação é alta, esse espaço fiscal é menor, e vice-versa. Assim, Argentina e Brasil estão com um pequeno espaço fiscal para expandir o consumo (custeio) público em relação ao Chile e México, por exemplo.
Naturalmente, no caso do Brasil, esse menor espaço fiscal decorre do fato notório de que, na última década, o ajuste fiscal recaiu basicamente sobre os investimentos públicos, preservando as despesas correntes, que, na maioria das vezes, são protegidas por dispositivos legais e constitucionais. Assim, sugerir a troca de custeio por investimento é obviamente mais fácil recomendar do que implementar. De fato, essa é uma discussão que ultrapassa a esfera ideológica, estando, pois, emaranhada em nossa estrutura institucional, a qual não contém adequado esquema de incentivos para buscar uma composição "ótima" de gasto público.
Concluindo, não se pode descartar a hipótese (aparentemente não-testável) de que determinados investimentos públicos, como os de em infraestrutura, geram expectativas positivas na economia, carreando novos investimentos privados a médio e longo prazo, embora não produzam efeitos significativos no produto no curto prazo. Dessa forma, justificar-se-ia o espaço fiscal para esses investimentos como contribuição da política fiscal para uma recuperação "mais" consistente da atividade econômica, sobretudo nesse ambiente de expectativas deterioradas.
Alexandre Manoel Angelo da Silva é pesquisador do Ipea.
José Oswaldo Cândido Júnior é pesquisador do Ipea cedido ao Senado.



A sobrevalorização da moeda não pode ser utilizada como arma complementar no combate a inflação
Propostas para a política cambial
Paulo Gala
10/06/2009
Num ambiente de conta capital relativamente aberta, a taxa de câmbio passa a se comportar como um ativo financeiro
A taxa de câmbio no Brasil vem se apreciando fortemente nas ultimas semanas, trazendo riscos consideráveis para a trajetória de nossa economia no médio prazo. Como muitos autores tem argumentado na literatura recente que trata dos efeitos do câmbio no processo de desenvolvimento econômico, as taxas de câmbio nominal e real resultantes das transações de mercado não implicam necessariamente em níveis ótimos do ponto de vista do desenvolvimento. Nesse sentido, torna-se necessário uma administração da política cambial com foco específico na promoção do desenvolvimento econômico. A literatura atual sobre o tema aponta para pelo menos três aspectos que seriam fundamentais num regime deste tipo: I) estabilidade e competitividade, II) ausência de metas explícitas e III) articulação com a política macroeconômica.
Um nível competitivo e estável da taxa de câmbio tem efeitos benéficos para a economia doméstica na medida em que estimula a produção de manufaturas para o mercado interno e mundial. Ao aumentar a rentabilidade da produção de bens comercializáveis industriais, um câmbio competitivo estimula o aumento de produção e investimento de indústrias nesse setor, rico em economias de escala, o que acaba por promover fortemente o aumento da produtividade dos trabalhadores. É importante fazer aqui um contraponto à tese de que um câmbio relativamente apreciado pode estimular aumentos de produtividade pois reduz o preço de máquinas importadas. De fato, dois canais operam em relação aos efeitos do nível do câmbio na produtividade doméstica. O primeiro diz respeito ao aumento de escala de produção e utilização de retornos crescentes estáticos e dinâmicos estimulados na indústria por um câmbio competitivo. O segundo diz respeito à incorporação de máquinas importadas em processos produtivos domésticos estimulada por câmbios apreciados. O efeito final do nível do câmbio na produtividade doméstica dependerá da força relativa de cada um desses dois canais.
A meu ver, o primeiro canal é mais importante e tende a sobrepor o segundo. Em processos de intensa apreciação cambial, a rentabilidade da produção de bens industriais para exportação e mercado doméstico se reduz, o que acaba por desestimular a importação de máquinas que poderiam melhorar a produtividade deste setor. Os únicos setores imunes a esse problema são aqueles produtores de bens não comercializáveis cuja rentabilidade não depende do nível da taxa de câmbio. Pode haver também um aumento de escala de produção industrial puxada pelo mercado interno, apesar da sobrevalorização do câmbio. Entretanto, mesmo nesse caso a trajetória da economia tende a ser insustentável devido à deterioração das contas externas. Um câmbio competitivo e estável, por outro lado, tende a promover o aumento de produtividade da economia e colocá-la numa rota de crescimento sustentável na medida em que mantém as contas externas em posição confortável.
Apesar de uma taxa mais competitiva de câmbio apresentar vantagens em relação a níveis mais apreciados quanto à dinâmica de produtividade, produção e equilíbrio de contas externas, a história recente mostrou que metas explícitas de câmbio são praticamente inviáveis devido à ocorrência de ataques especulativos. Tentativas de se fixar uma taxa específica no mercado acabam se tornando alvo de dinâmicas especulativas na medida em que agentes financeiros tem um estímulo muito forte para derrubar o regime. Num ambiente de conta capital relativamente aberta, a taxa de câmbio passa a se comportar como um ativo financeiro e, portanto, torna-se muito difícil para qualquer governo controlar seu preço. Na arquitetura financeira atual o que é possível fazer, portanto, é uma intervenção assimétrica no mercado de câmbio, privilegiando a manutenção de taxas competitivas e relativa estabilidade num regime flutuante através de pesadas compras de reservas cambiais em momentos de bonança e, no limite, através da adoção de controles de capital a entrada como fez com sucesso o Chile nos anos 80.
As intervenções podem ser feitas, preferencialmente, a partir da geração de superávits correntes nas contas do governo como têm feito países asiáticos ou ainda a partir da criação de um fundo de estabilização cambial com financiamento via dívida pública que seria criado pelo governo com o objetivo de administrar a política cambial. Nesse último caso, os níveis de taxas de juros devem ser menores ou iguais aos juros externos para que a política de acumulação de reservas seja sustentável. Um regime cambial deste tipo deverá estar também fortemente articulado com a política monetária e fiscal para que seja efetivo. Em relação à política monetária é necessário que se faça uma flexibilização do atual regime de metas de inflação para que os objetivos da política cambial sejam acomodados. Não há necessidade de se colocar a taxa de câmbio explicitamente como objetivo da política monetária, mas a meta implícita de competitividade do câmbio real deve ser levada em consideração no manejo do regime monetário. A sobrevalorização cambial não pode ser utilizada como arma complementar no combate a inflação como vem sendo feito recentemente no país. No limite, num regime como esse, a responsabilidade pelo controle da inflação e manejo da demanda agregada recai sobre a política fiscal. Uma política fiscal austera e geradora de superávits nominais é fundamental, portanto, para a manutenção do câmbio num nível competitivo.
Uma política cambial anticíclica e assimétrica com foco no desenvolvimento econômico tem como principal objetivo manter o câmbio real numa posição estável e competitiva e, portanto, promover o aumento da produtividade doméstica via aumento da escala de produção industrial para o mercado doméstico e mundial. O aumento de produtividade decorrente da transformação estrutural da economia possibilita o aumento do salário real de maneira sustentada no longo prazo, ao contrário das políticas de apreciação cambial que acabam promovendo aumentos passageiros e insustentáveis de salários reais no curto prazo.
Paulo Gala é economista da Escola de Economia de São Paulo-FGV/SP.



Buracos na teoria sobre a racionalidade do mercado JOE NOCERAENSAIO
NYT - Folha de São Paulo, 15 de junho de 2009
Há alguns meses, Jeremy Grantham, respeitado estrategista de mercado da GMO, companhia institucional de gestão de capitais, vem se queixando da -veja só!- hipótese do mercado eficiente.Essa teoria brotou do departamento de finanças da Universidade de Chicago e predominou por muito tempo em círculos acadêmicos. Diz que a Bolsa não pode ser vencida em uma base consistente, porque toda a informação disponível já está embutida nos preços das ações. Em outras palavras, a Bolsa é racional.
Na última década, a hipótese do mercado eficiente, quase um dogma desde o início dos anos 1970, recebeu algumas críticas sérias. Primeiro veio a ascensão dos economistas behavioristas, como Richard H. Thaler, da Universidade de Chicago, e Robert J. Shiller, da Universidade Yale, que mostraram que a psicologia de massas e o comportamento de rebanho podem ter enorme efeito nos preços das ações -o que significa que o mercado não é tão eficiente, afinal. Depois vieram provas tangíveis: a bolha da internet e a bolha imobiliária.
Hoje em dia seria difícil encontrar alguém, mesmo na Universidade de Chicago, que afirme que o mercado é perfeitamente eficiente. Mas Grantham não desanimou com seu declínio. Na opinião dele, a hipótese do mercado eficiente é mais ou menos diretamente responsável pela crise financeira.Ele continuou: "A incrivelmente imprecisa teoria do mercado eficiente foi totalmente adotada por muitos de nossos líderes financeiros. Ela deixou nosso establishment econômico e governamental esperando confiantemente, enquanto uma combinação letal de bolhas de ativos, controles frouxos, incentivos perniciosos e instrumentos malignamente complexos levaram a nossas atuais dificuldades".
Não pude deixar de pensar na explicação de Grantham enquanto lia o livro de Justin Fox, "The Myth of The Rational Market" (O mito do mercado racional), história do que se poderia chamar de ascensão e queda da hipótese do mercado eficiente. A tese de Fox é que os marqueteiros eficientes originalmente apoiavam uma boa ideia. Mas, isolados em seus casulos acadêmicos, eles desenvolveram uma lógica interna muito distante das realidades do mercado. Foi preciso um novo grupo de economistas, os behavioristas, para trazer os profissionais de volta à realidade.Fox afirma, ecoando Grantham, que a hipótese do mercado eficiente teve um papel exagerado em moldar o pensamento americano que atuou nos últimos 30 anos ou mais. Mas Fox também discorda dele, ao afirmar que o efeito não era necessariamente todo ruim.
"Não há maneiras fáceis de superar o mercado", disse Fox. Se você quiser indicar a melhor coisa que a hipótese do mercado eficiente nos ensinou é a lição: não podemos vencer o mercado.Na visão de Grantham, se os investidores profissionais admitissem as aberrações do mercado -e negociassem levando em conta o fato de que o mercado estava desordenado- eles poderiam ter vencido o mercado. Mas graças à hipótese do mercado eficiente, ninguém se dispôs a chamar a bolha de bolha -porque, afinal, os preços das ações eram racionais.Perguntei a Burton Malkiel, autor de "A Random Walk Down Wall Street" (Um passeio ao acaso por Wall Street) e economista da Universidade Princeton, o que ele acha das teorias de Grantham.
"É ridículo" culpar a hipótese do mercado eficiente pela crise, ele disse. "Se você está alavancado 33-1 e detém papéis de longo prazo e usa endividamento de curto prazo, e então acontece uma corrida ao banco -que foi o que aconteceu no Bear Stearns-, como você pode pôr a culpa na teoria do mercado eficiente?"Então começamos a falar sobre bolhas. "Eu acho que as bolhas existem", ele disse. "O problema delas é que você não pode reconhecê-las antecipadamente." Pensei: se um sujeito inteligente como Burton Malkiel teve de esperar a bolha da internet acabar para perceber que estávamos em uma, então talvez Grantham tenha certa razão, afinal.



"The Invincible Markets Hypothesis"
There are two versions of the efficient markets hypothesis, a strong version and a weak version. According to the strong version prices accurately reflect the underlying intrinsic value of financial assets, but the weak version only requires that prices be unpredictable, they don't have to accurately reflect fundamental values.
The strong version is, well, too strong and it seems clear that this condition is not satisfied in asset markets, at least not on a continuous basis. The weak version, however, does have support (though even here there is not universal agreement). The distinction between the strong and weak versions, and the assertion that the weak version holds even if the strong version does not, is often used as a defense of the efficient markets hypothesis.
Rajiv Sethi asks a good question. If the strong version of the efficient markets hypothesis does not hold, in what sense does satisfying the weaker form constitute "efficiency"? He argues that "it makes little sense to say that markets are efficient, even if they are essentially unpredictable in the short run. In light of this, he proposes a new name for the weak form of the hypothesis:
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Não será o que pareceAntonio Delfim Netto
22/09/2009
Seguramente, um dos problemas complexos e de solução enigmática que perturba quase todos os analistas que procuram entender como será o mundo depois da crise, é o de tentar "prever" como os EUA resolverão os seus graves problemas. Eles podem ser grosseiramente formulados da seguinte maneira:
1) Quando o nível de atividade, graças à recuperação da "confiança" do setor privado e à regularização do financiamento, ameaçar uma retomada inflacionária (o que só ocorrerá quando houver significativa pressão no mercado de trabalho extremamente flexível dos EUA), como agirá o FED para retirar a enorme massa de liquidez que criou em resposta à emergência da crise?
2. Como serão metabolizados os imensos déficits e o consequente aumento da relação dívida/PIB que ajudaram a realizar o item anterior e estimularam um verdadeiro programa fiscal "anticíclico", executado basicamente pelo setor privado com financiamento e que aumentarão a produtividade da infraestrutura e deixarão pequenos aumentos de gastos de custeio?
3) Como, sem uma recessão e uma dramática desvalorização do dólar, os EUA poderão reduzir o seu déficit comercial e em conta corrente, que foram fundamentais para a grande expansão da economia mundial que precedeu à crise? Esta foi financiada pela criação de "inovações" financeiras que permitiram uma "ciranda" (autofecundada). Elas criaram um desequilíbrio que permitiu aos EUA acumular, entre 2002 e 2008, um déficit em conta corrente da ordem de US$ 4.531 bilhões, compensados por um superávit em contas correntes de US$ 2.175 bilhões dos países desenvolvidos (sem EUA) e US$ 2.887 bilhões dos países emergentes (48% dos quais com a China!).
Olhados globalmente, os problemas envolvem uma solução difícil e complicada, que exige um "foco" seguro a ser perseguido. Tudo começa pelo entendimento que todos terão saída, que convergirá para o único objetivo de "segurança nacional" dos EUA, explícito no programa de Barack Obama: a reconquista, nos próximos dez anos, da relativa autonomia energética perdida pela nação americana.
A despeito de toda a "filosofia" internacionalista e do conto de fadas que a "globalização eliminou o poder dos Estados", nunca os que têm pretensão e podem ser "potência" (!) abandonaram a ideia de que precisam de três autonomias: 1) alimentar; 2) energética; e 3) militar. Esses objetivos saltam aos olhos, ainda que sob o "disfarce" do "politicamente correto" nos EUA, na Europa, na Rússia e na China.
Alguém pode, realisticamente, acreditar que a Europa vai continuar a assistir indiferente e sem proteger-se, com alternativas adequadas, do controle energético politicamente exercido sobre ela pela Rússia? E alguém, realisticamente, pode imaginar que a China dará liberdade ao Tibete para controlar a sua água? No caso dos EUA, a dependência energética do petróleo é preocupante: basta dizer que as Forças Armadas dos EUA no exterior consomem cerca de 350 mil barris por dia e que as importações de petróleo representam quase 1/3 do valor do déficit comercial americano.
O problema de curto prazo (absorção da liquidez) será resolvido (um pouco melhor ou um pouco pior) reduzindo a massa monetária, à medida que a velocidade da moeda (devido à retomada da confiança) aumentar. O FED aprendeu muito nos últimos 12 meses: a "sujeira" que ele admitiu em seu "guichê" em três meses ensinou-lhe mais do que os "modelos" que cultivou nos últimos dez anos... Não existe nenhum motivo razoável para imaginar que o FED permitirá que a "enchente de liquidez" se manifeste como uma inflação desenfreada no futuro próximo. E não será (como alguns ainda pensam) com o controle apenas da taxa de juros. As "facilidades monetárias" voltaram: têm ida e têm volta...
A domesticação da dívida/PIB será feita, de um lado, por uma aceleração do crescimento do PIB (no novo padrão produtivo científico-tecnológico criado para reduzir a dependência da energia importada) e, de outro, pelo controle da taxa de juros num entendimento Tesouro-FED (lembremo-nos da Segunda Guerra Mundial). Não tenhamos ilusão: é o FED e não o mercado que fará a taxa de juros, com todas as suas consequências. A ideia do "mercado perfeito" foi assassinada e a ação do governo (com seus acertos e erros) está em plena ressurreição...
O potencial de substituição da importação de petróleo (e de redução do déficit comercial dos EUA) pela produção de energia mais limpa e sustentável por dezenas de novos caminhos científicos e tecnológicos, que vão dominar a nova agenda industrial americana, reserva surpresas insondáveis.
O controle da liquidez, a volta do crescimento (dentro da nova agenda ,que como subproduto vai reduzir a emissão de CO2), o reconhecimento que a baixa taxa de juros não será um ato do mercado, mas da coordenação do Tesouro e do FED e, finalmente, a dramática redução do consumo de energia fóssil importada, mostram que há mais coisa no horizonte do que supõe nossa pobre teoria...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras
E-mail: contatodelfimnetto@terra.com.br




Entrevista: Os Estados Unidos não têm como sair da armadilha fiscal, a não ser fazendo a desvalorização da dívida com inflação, avalia o economista Willem Buiter.
Acabou-se a credibilidade
Por Sergio Lamucci, de São Paulo
19/06/2009
Bloomberg
Willem Buiter: mais inflação nos Estados Unidos e dificuldades no mundo ainda por vários anos, cenário em que o Brasil terá que cuidar de suas vulnerabilidades
A situação das contas públicas nos Estados Unidos é extremamente delicada, devendo obrigar o governo a optar entre a inflação mais alta e o calote da dívida para resolver o problema da trajetória fiscal insustentável, alerta o economista Willem Buiter, professor da London School of Economics and Political Science. "Os Estados Unidos não têm mais credibilidade fiscal", disse Buiter, em entrevista ao Valor. Para ele, a escolha deverá recair sobre o aumento da inflação, que corrói o valor real da dívida.
Em seu blog Maverecon, abrigado no site do "Financial Times", Buiter escreve que "os mercados estão lentamente acordando para a ameaça da inflação como uma solução para a insustentabilidade fiscal nos Estados Unidos", o que ajuda a explicar o aumento recente das taxas dos títulos de longo prazo do Tesouro americano. Nos próximos três anos, o risco de deflação é maior do que o de inflação. No entanto, depois desse prazo, "e certamente daqui a mais de cinco anos, o risco de inflação alta [entre 5% e 15%, por exemplo] é real".
Com a explosão do déficit público, que deve superar 12% do PIB neste ano e pode ficar entre 13% e 14% no ano que vem, os gastos para recapitalizar os bancos e as despesas para salvar empresas como GM e Chrysler, a dívida dos Estados Unidos, hoje equivalente a 70% do PIB, pode ultrapassar os 100%, avalia Buiter, nascido na Holanda e hoje cidadão americano e britânico. Além disso, há também os compromissos do presidente Barack Obama com saúde, infraestrutura, ambiente e educação. Como acredita que os democratas tendem a vetar qualquer corte futuro de gastos e os republicanos estarão contra qualquer aumento de impostos, Buiter vê a trajetória das contas públicas como insustentável. A solução pode vir pelo aumento da inflação ou por um calote da dívida. Como no passado, os Estados Unidos tendem a escolher a inflação.
Ruy Baron / Valor
No Brasil, Buiter viu equívocos em avaliações da crise, inclusive a de Lula
Buiter não gosta da opção trilhada pelo governo Obama para tentar resolver os problemas do sistema financeiro. Desde janeiro, ele defende a adoção do modelo do "banco bom". Por essa proposta, o dinheiro público seria usado para capitalizar bancos novos que não tenham excesso de maus investimentos e maus empréstimos. Os novos financiamentos seriam feitos apenas por esses bancos, que ficariam com os depósitos dos "bancos ruins" e comprariam os bons ativos dessas instituições. Os "bancos ruins" seriam proibidos de fazer novos empréstimos e investimentos, simplesmente administrando os estoques de ativos que sobraram.
Segundo Buiter, sua proposta é melhor "por que faz os credores sem garantias pagarem pelas perdas dos bancos. Quem fez maus investimentos paga, em vez dos contribuintes". E por que não se fez assim? "Parte dos membros do governo é muito próxima dos mercados financeiros e dos credores sem garantias. É um exemplo de captura do Estado por interesses do setor financeiro", responde Buiter, que foi membro do Comitê de Política Monetária do Banco da Inglaterra (o banco central inglês) entre 1997 e 2000.
Para Buiter, os governos e os bancos centrais conseguiram evitar que a economia global viva uma nova Grande Depressão, como a ocorrida nos anos 1930. O mais provável, avalia, é que o mundo atravesse um longo período de baixo crescimento, de cerca de cinco anos. Ele se mostra cético quanto à capacidade da China de se transformar na locomotiva da economia global. Quanto ao Brasil, disse que o país está de fato mais preparado para enfrentar a crise, pela situação das contas externas e fiscais e do nível de reservas, mas nota que não há como um grande exportador de commodities não ser afetado pela crise. Conta que veio ao Brasil em março de 2008, para dar uma palestra na reunião do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), e se surpreendeu com o pouco caso com que autoridades e empresários brasileiros tratavam da crise, como se fosse "um problema ianque". "Vocês precisam da recuperação da economia global para prosperar." A seguir, os principais trechos da entrevista.
AP
"A resposta do governo Obama à crise foi um grande erro de julgamento"
Valor: Desde março, os preços de commodities e de ações dispararam, apesar de algumas notícias muito ruins na economia real. Isso significa que o pior da crise já passou ou estamos vivendo uma outra bolha de preços de ativos?
Willem Buiter: Acho que as pessoas não temem mais que o mundo esteja chegando ao fim, não acreditam que haverá uma queda de dez anos como na Grande Depressão. Em termos de crescimento, desemprego, nível de atividade, o pior ainda está por vir. Como disse Jean Claude Trichet [presidente do Banco Central Europeu], a economia passou provavelmente pelo ponto de inflexão, o que significa que as coisas estão ficando piores mais lentamente. No entanto, ainda não atingiram o ponto de virada, em que as coisas começam a melhorar. A questão é que os mercados financeiros frequentemente respondem mais cedo a perspectivas de melhoras futuras do que o resto da economia. Realmente, não estou surpreso pela recuperação dos preços de ações. A queda dos preços tinha sido provavelmente exagerada, não considerando as cotações de ações do setor financeiro. O setor financeiro ainda é uma área desastrosa e estou muito surpreso de que tenha havido uma recuperação aí. Mas, no caso dos outros setores da economia, não acho que os mercados de ações estavam particularmente supervalorizados em grande parte do mundo, até mesmo em meados de 2007. O colapso dos preços das ações tinha sido um pouco exagerado. Alguns mercados de ações estavam supervalorizados, especialmente em alguns países emergentes, como na Rússia, na China e, até certo ponto, no Brasil, mas mesmo nesses países a reação foi exagerada. Alguma recuperação é inteiramente normal. Não é realmente uma bolha de ativos, exceto pelas ações do setor financeiro, que continua numa situação muito ruim e é improvável que melhore em breve.
Valor: Quais são as principais causas da desvalorização do dólar? É algo preocupante?
Buiter: Depende para quem (risos). Claramente, quem detém ativos em dólar não vai ficar muito feliz. É o caso do banco central chinês, dos países do Golfo Pérsico, do banco central russo e de todo investidor em títulos denominados em dólar. Acho que a desvalorização é uma resposta perfeitamente normal para o fato de que, no geral, o Fed foi o mais expansionista dos principais bancos centrais nesta crise. Os investidores respondem à possibilidade de que os Estados Unidos podem estar numa trajetória fiscal insustentável, que será corrigida no futuro através de inflação mais alta, reduzindo o valor da dívida elevadíssima contraída pelo governo, como já foi feito no passado. Mas não acho que veremos em breve uma parada súbita de capitais para os Estados Unidos, no estilo do que ocorria com os mercados emergentes, em que os investidores se recusavam a ficar com a moeda e os títulos soberanos americanos, levando a um colapso financeiro da moeda e a um default. É mais provável que os Estados Unidos resolvam o seu problema de insustentabilidade fiscal por meio de inflação mais alta, mas moderada, do que por meio de um calote na dívida ou um colapso da moeda.
Valor: Há um debate sobre a alta dos juros de longo prazo nos Estados Unidos. O historiador Niall Ferguson diz que os elevados déficits fiscais estão empurrando as taxas para cima. O sr. acha que os Estados Unidos e o Reino Unido devem apertar um pouco a política fiscal para evitar dúvidas sobre a solvência fiscal dos governos?
Buiter: Há dúvidas reais, especialmente nos Estados Unidos, mas até certo ponto também no Reino Unido, sobre a solvência de longo prazo do governo. Acho que um default é muito improvável. Pode haver aumento nos prêmios de risco de calote, mas se você olhar para o mercado de "credit default swaps" (CDS) para os governos dos Estados Unidos e do Reino Unido, eles sugerem que não há muita atividade. Os governos têm uma opção menos perigosa, que é inflacionar a dívida, o que leva a um aumento dos juros nominais de longo prazo. Se há um risco de aumento do risco de inflação, isso leva um aumento dos juros reais. Acho que é isso que estamos vendo. Para corrigir isso, é necessário um compromisso crível com um aperto fiscal futuro, que os Estados Unidos não têm condições de fazer.
Valor: OS Estados Unidos devem apertar a política fiscal agora?
Buiter: Não agora, mas eles têm que ser capazes de se comprometer com um programa de aperto muito significativo, digamos, dentro de cinco anos, e eles não podem. Os mercados sabem disso, acredito. Se os mercados ficarem realmente assustados, talvez o único modo de ganhar credibilidade seja fazer um aperto fiscal antes do que seria necessário se eles a tivessem. Mas os Estados Unidos não têm mais credibilidade fiscal. Não acreditam em dor, exceto em Guantánamo. Basicamente, os democratas tendem a vetar qualquer corte de gastos futuros e os republicanos tendem a vetar aumentos de impostos. Isso significa que os dois partidos excluem, por causa da disfuncionalidade do sistema político americano, qualquer solução de longo prazo para a situação fiscal insustentável que não envolva calote ou inflação mais alta. O Reino Unido está numa versão mais branda dessa situação, porque o Executivo aqui é muito mais forte que o americano. Não há freios e contrapesos. São más notícias para a democracia e para os direitos civis, mas pode ser uma boa notícia para a credibilidade fiscal. O único risco no Reino Unido é, se houver um parlamento dividido na próxima eleição, em que nenhum partido tenha maioria ampla. O Reino Unido não tem nenhuma experiência com um governo de coalizão. Isso pode fazer com que não haja força política suficiente para impor a dor fiscal, que é considerável, e terá que ser imposta para o país continuar solvente.
Valor: Os bancos centrais e os governos conseguiram evitar uma nova Grande Depressão
Buiter: Provavelmente, sim. Se você comparar o que os governos e os bancos centrais em todo o mundo fizeram nesta crise com o que fizeram nos anos 1920, a política monetária agora é muito mais expansionista, os juros são mais baixos, há a política de alívio quantitativo [a compra de títulos públicos e privados pelos bancos centrais] e a base monetária aumentou muito mais. Além disso, não houve a adoção de políticas pró-cíclicas, a não ser em alguns países que estavam fiscalmente mortos, como Islândia, Letônia e Hungria. Muitos dos maiores países puderam deixar os estabilizadores fiscais operarem normalmente e adotaram algumas medidas discricionárias de política fiscal. Então, é uma situação bem diferente. Também se evitaram grandes guerras internacionais de comércio. Espero que as coisas continuem feias, mas não uma repetição da Grande Depressão.
Valor: Então é mais provável que o mundo experimente um período longo de baixo crescimento do que uma nova depressão?
Buiter: Exatamente. Pode ser um período de cerca de cinco anos, com a economia crescendo abaixo do potencial.
Valor: Como o sr. analisa a resposta do governo Obama à crise, especialmente em relação ao sistema financeiro? Ela resolveu os problemas bancários ou a solução ainda está distante?
Buiter: Foi pobre. Foi melhor que no Reino Unido e nos outros países da Europa, mas ainda assim foi patético. Um fator que contribui para instabilidade financeira futura é que, depois do caso do Lehman Brothers e do Washington Mutual, eles declararam todos os credores sem garantias dos grandes bancos como credores com garantias. Com isso, colocaram o dinheiro dos contribuintes, em vez de exigir que os credores sem garantias se convertessem em acionistas. É um grande erro de julgamento e de coragem política, e eles vão pagar um preço caro por causa disso. No curto prazo, isso não importa muito, por que, enquanto os bancos tiverem capital, não importa de onde ele vem. Mas de um ponto de vista de longo prazo, com a questão do risco moral, basicamente o que se disse aos bancos nos Estados Unidos é que eles realmente eram muito grandes ou politicamente bem relacionados para falir. Tudo foi muito mal desenhado do ponto de vista dos incentivos.
Valor: O sr. tem uma proposta para resolver a crise no sistema financeiro baseada no modelo do "banco bom". Por que ela é melhor do que a adotada pelo governo?
Buiter: Porque faz os credores sem garantias pagarem pelas perdas dos bancos. Quem fez maus investimentos paga, em vez dos contribuintes. Do ponto de vista dos incentivos, esse é o modelo correto a ser seguido.
Valor: Por que eles não adotaram uma solução na linha da sua proposta?
Buiter: Parte dos membros do governo muito próxima dos mercados financeiros e dos credores sem garantias. É um exemplo de captura do Estado por interesses do setor financeiro. Os credores sem garantias são outros bancos, fundos de pensão, companhias de seguros, e são muito mais vocais, têm lobbies mais eficientes do que os contribuintes.
Valor: Quais as principais lições da crise para os reguladores? [a entrevista foi feita antes do anúncio do plano de Obama para a regulação.]
Buiter: A primeira é que é necessário regular o risco onde ele estiver localizado, e não regular instituições ou instrumentos do mercado. É necessário ter uma visão global do risco, que está sempre associado à alavancagem e descasamento, especialmente descasamento de duração e liquidez. Em qualquer tipo de instituições que ele estiver. O segundo ponto é que a regulação tem que ser feita no nível dos mercados. Se as instituições são globais, a regulação tem que ser global. Se não houver padrões globais de regulação e uma aplicação global da regulação, haverá uma competição entre reguladores, por que todo mundo quer atrair atividade financeira para os seus próprios centros financeiros. Isso é uma lembrança de que não se pode deixar nenhuma instituição se tornar muito grande para falir. Se ela é grande demais para falir, ela é grande demais. É necessário dividir os bancos e separá-los. É importante elevar as exigências de capital, assim como evitar que as instituições entrem em atividades que envolvam conflitos de interesses.
Valor: O sr. acredita que a China pode ser uma locomotiva para a economia global?
Buiter: Acho que pode ajudar, mas a China não é os Estados Unidos. O país não é grande o suficiente para agir como uma locomotiva. É mais um pequeno motor que pode ajudar. O problema para a China, mesmo para ser um pequeno motor, é que tem que redirecionar a demanda do setor exportador para a demanda doméstica, especialmente o consumo. Temo que eles não estejam prontos para isso. A China é um grande petroleiro. É muito difícil fazê-la mudar de direção. Tenho certeza de que eles entenderam que têm que dar mais importância para a demanda doméstica, mas a questão é como fazer isso. A China sabe o que tem que fazer, mas a questão é quão rapidamente pode fazer isso. Duvido que consigam ainda em tempo para esta recessão. Mas eles podem nos surpreender. Essa é a minha esperança.
Valor: Como analisa a situação do Brasil nesta crise?
Buiter: O Brasil está obviamente em melhor forma para lidar com esta crise do que nos últimos 30 ou 40 anos. No entanto, estive no Brasil em março de 2008, e fui surpreendido com o pouco caso com que empresários e autoridades tratavam da crise, como se fosse um problema "ianque", que possivelmente não afetaria o Brasil, por que o país tinha uma situação externa mais sólida, mais reservas internacionais e disciplina fiscal. Isso tudo é verdade e isso tudo ajuda, mas, se o comércio global entra em colapso e os preços de commodities despencam, países voltados para o comércio exterior ou grandes exportadores de commodities, como o Brasil, sofrem, e era claro que o país sofreria. As pessoas também não entenderam que a posição externa financeira líquida era forte e positiva, mas ainda havia muita dívida bruta. As empresas brasileiras tinham se endividado bastante em moeda estrangeira no curto prazo. Havia muita complacência e satisfação com o fato de os "ianques" terem sido atingidos, para variar. Consigo entender a reação, por que, depois de receber sermões por 30 anos do Grande Irmão em Washington, é de algum modo interessante assistir a ele cometer todos os erros de que você era acusado. Ainda assim, isso não é um bom guia para as políticas, e o país ainda está vulnerável. Vocês precisam da recuperação da economia global para prosperar. Até que isso ocorra, terão que depender da demanda doméstica. Se não fizerem isso de modo inteligente, podem afetar as fontes da robustez fiscal e externa que permitiram que vocês resistissem ao pior da crise, em primeiro lugar. Será um desafio. Vocês terão um outro ano difícil até que a economia global se recupere.
Valor: O sr. escreveu um post criticando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela declaração de que a crise foi causada pelo comportamento irracional de brancos de olhos azuis. O que o desagradou na frase?
Buiter: É uma pena, por que o presidente Lula é, de muitas maneiras, um grande homem, e esta frase está abaixo dele. É uma tirada política barata. Não é algo desastroso, mas ele deveria focar no que é de fato importante, e não transformar um assunto de má administração, incompetência, ganância e problema de regulação num assunto racial. Isso não ajuda.



A conspiração vai continuar...
Antonio Delfim Netto
07/07/2009
A competente jornalista Cláudia Safatle, que ilumina este espaço às sextas-feiras, publicou um excelente artigo no qual revelou as ideias que, a respeito da taxa de câmbio, circulam entre nós. O seu título foi "Tudo conspira pela apreciação do câmbio". Pode até ser verdade, mas há controvérsia!
As considerações entre câmbio "valorizado" e distribuição de renda exigem maior precisão sobre suas hipóteses e pesquisas empíricas de efetiva causalidade, antes que se possa tirar delas as consequências sugeridas. A troca pode ser entre salário real e lucro real mas ela será temperada pelo nível de investimento e emprego, o que impõe considerações sobre o longo prazo e exige, portanto, uma análise dinâmica. Sobre o que não há qualquer dúvida, por exemplo, é o fato que taxa de juro real interna acima da externa para sustentar câmbio valorizado transfere renda do setor produtivo (trabalhador e empresário) para o setor financeiro rentista, sem nenhum benefício para o emprego e para o desenvolvimento econômico.
A discussão sobre a taxa de câmbio é mesmo inexorável e vai continuar porque suas duas encarnações, como preço relativo (entre os bens transacionáveis e os não transacionáveis) ou preço de um ativo financeiro (quando há liberdade de movimento de capitais) juntamente com a taxa de juro real e o salário real, são as variáveis determinantes do equilíbrio macroeconômico.
Desde logo é preciso reconhecer que essa discussão, mesmo quando pretende a objetividade "científica", sempre envolverá um viés. De um lado, teremos os elegantes "cientistas" do equilíbrio, evangelistas da doutrina do mercado perfeito e da sua misteriosa capacidade de produzir os preços relativos ótimos que levam à maximização do bem estar. Sabemos que com hipóteses restritivas convenientemente escolhidas eles "existem". O que não sabemos é se há algoritmo que nos leve a eles! De outro, teremos alguns céticos corrompidos pela ideia que o desenvolvimento econômico não é, seguramente, o resultado natural da "ciência do equilibrismo". É um fenômeno idiossincrático estimulado por um estado-indutor amigo dos "mercados", cuidadoso com as suas finanças e portador de alguma ousadia.
Apenas para dar um exemplo: mesmo no caso simples das relações entre a taxa de câmbio e a taxa de juros, que teria tudo para ser um fato objetivo na "explicação" do "carry trade", as diferenças de opinião são fantásticas. No dia 19 de junho um reconhecido especialista brasileiro assegurava que o "carry trade" não pagava. No mesmo dia especialistas em Nova York, diziam (via Bloomberg) que bons lucros podiam ser feitos com o real brasileiro e o rand sul-africano! Trata-se, obviamente, da deformação que a aritmética sofre quando atravessa o Equador...
Com relação a salário real e distribuição de renda em função do nível da taxa de câmbio, a diferença de enfoque é mais produto de confusão do que real. "Desvalorização" ou "valorização" (no caso brasileiro "supervalorização oportunística"), são conceitos relativos a uma suposta taxa de câmbio de equilíbrio (que funde as duas "encarnações" referidas acima) e cuja existência depende da rápida convergência da taxa de juro real interna para a externa.
A respeito, nada mais instrutivo do que observar o que aconteceu com a taxa de câmbio "real" da Alemanha e seus efeitos sobre o emprego depois da unificação das moedas da comunidade europeia. Alemanha, França e Itália fixaram, irretratavelmente, suas taxas de câmbio nominais no euro, o que significa que as relações deutsch-mark/franco e deutsch-mark/lira e franco/lira foram estabelecidas para sempre. Por um lado as finanças públicas da França e da Itália se beneficiaram imediatamente da queda de juros dos papéis com que financiam as suas dívidas, que passaram a ser nominadas numa moeda mais confiável, o euro. Por outro lado, lentamente, França e Itália viram suas exportações e importações se alterarem em benefício da Alemanha: as exportações da Alemanha para a França e Itália cresceram e as exportações da França e da Itália para a Alemanha diminuíram. Tudo se passava como se tivesse havido uma desvalorização da moeda alemã com relação à francesa e italiana.
O que houve? Apenas isto: combinado com o governo, o corporativismo que domina o mercado de trabalho alemão aceitou algumas pequenas "reformas" no nível microeconômico objetivando o aumento do nível de emprego. Para estimular as exportações (40% do PIB), os sindicatos aceitaram, também, uma moderação dos aumentos salariais: o custo unitário do trabalho na Alemanha cresceu entre 2001/06, 0,2% ao ano, contra 2% na França e 3% na Itália. Isso desvalorizou efetivamente a relação salário/câmbio (que é a taxa de câmbio que importa) da Alemanha. A relação entre taxa de câmbio e distribuição de renda talvez seja um pouco mais complicada do que parece e precisa, também, ser entendida dinamicamente.
Toda essa discussão sobre o "nível" da taxa de câmbio deixa de lado as danosas consequências de sua "volatilidade" sobre o investimento nos setores de exportações potencialmente competitivas na indústria e nos serviços. Estes são os únicos que poderão nos ajudar a dar emprego a 146 milhões de brasileiros com idade entre 15 e 65 anos em 2020.
É por tudo isso que a discussão civilizada sobre o papel da taxa de câmbio no processo de desenvolvimento deve continuar. Mesmo porque, no dia 30 de junho, praticamente todos os Bancos Centrais do mundo (até o suíço!) estavam intervindo para evitar a valorização das suas moedas no momento de recessão...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras.


Apreciação cambial: causas, efeitos e o que fazer
José Luís Oreiro e Luiz Fernando de Paula
08/07/2009
As boas notícias quanto ao desenrolar da crise financeira internacional, somadas à expectativa de recuperação, ainda que parcial, da economia brasileira, fez com que os capitais externos retomassem seu fluxo positivo por conta principalmente do ingresso de investimento direto e de aplicações em bolsa, e, em menor grau, em títulos de renda fixa. Como resultado da intensificação nos fluxos de entradas de capitais, observou-se uma apreciação de mais de 20% da taxa de câmbio entre março e junho deste ano.
O problema fundamental da apreciação cambial é o impacto que a mesma tem a longo prazo sobre estrutura produtiva da economia, induzindo a especialização perversa em atividades de baixo valor agregado e com baixa elasticidade-renda nas exportações, o que acaba reduzindo a taxa de crescimento que é compatível com o equilíbrio de longo prazo do balanço de pagamentos. Deve-se ressaltar que os fluxos de capitais externos pouco podem fazer para compensar o efeito da mudança da estrutura produtiva sobre a restrição externa. Conforme mostrado recentemente num estudo elaborado pelos economistas britânicos John McCombie e Mark Roberts, a taxa de crescimento compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos é pouco sensível à variações da taxa de crescimento do fluxo de capitais externos. O determinante fundamental da restrição externa no longo prazo é o grau de especialização da estrutura produtiva por intermédio do efeito da mesma sobre a relação entre a elasticidade-renda das exportações e a elasticidade-renda das importações. Via de regra, países com estrutura produtiva mais diversificada e maior participação da indústria no PIB (principalmente a indústria com alta densidade tecnológica) tem uma elasticidade-renda das exportações mais alta e uma elasticidade-renda das importações mais baixa, apresentando assim uma taxa de crescimento compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos que é mais elevada.
Acrescente-se a esse quadro o fato de que uma tendência persistente de apreciação da taxa de câmbio a longo prazo pode ainda estimular uma "troca" de poupança doméstica por poupança externa, em função do barateamento na captação de funding externo por parte dos agentes econômicos. Um país não pode incorrer em déficits no balanço de pagamentos que resultem em um aumento contínuo da razão passivo externo/PIB. Se isso ocorre, a acumulação de passivo externo poderá alcançar um ponto crítico após o qual ocorre uma "parada súbita" do financiamento externo que irá resultar numa desvalorização forte e brusca da taxa nominal de câmbio, alimentando assim o processo inflacionário devido ao efeito pass-through, principalmente em países como o Brasil, onde uma parte não desprezível no índice de preços "oficial" é fortemente influenciado pelo comportamento da taxa de câmbio.
A literatura empírica dá farta evidência sobre os problemas enfrentados por países com exportações de baixo valor agregado e com uso prolongado de uma taxa de câmbio apreciada. Por exemplo, estudo utilizando uma amostra de 60 países no período 1965-2003 para avaliar os efeitos sobre o crescimento econômico de desalinhamentos da taxa de câmbio real, feito por Aguirre e Calderón ("Real exchange rate misalignments and economic performance"), obteve os seguintes resultados: I) países em desenvolvimento mostram maior grau de desalinhamento do que os países industriais; II) há uma relação negativa e significativa entre crescimento e desalinhamento; III) o crescimento econômico é afetado adversamente tanto pela sobrevalorização quanto desvalorização real da taxa de câmbio, embora o efeito seja maior no primeiro caso; IV) o efeito sobre crescimento é mais adverso quanto maior for o tamanho da sobrevalorização; V) pequenas desvalorizações (até 12%) têm efeito positivo sobre crescimento, enquanto que grandes desvalorizações têm efeito negativo.
A recente valorização da taxa de câmbio acende de novo uma luz amarela, já que dificilmente seremos beneficiados pelo cenário de "céu de brigadeiro" de forte crescimento tanto na demanda externa quanto nos preços de commodities, o que permitiu nos últimos anos que superássemos, ainda que temporariamente, a restrição externa ao crescimento, mesmo com um câmbio apreciado.
O governo sinaliza que poderá fazer uso de uma alíquota de IOF de 1,5% sobre aplicações de investidores externo em renda fixa (Valor, 29/05/2009) para lidar com este problema. Há vários motivos para duvidarmos da eficácia de tal medida. Em primeiro lugar, as aplicações em renda fixa são uma parte menor do fluxo total de capitais externos no Brasil, o que por si só limita sua eficácia. Em segundo lugar, dada a característica de fungibilidade do capital, a taxação de uma forma específica das entradas de capitais no Brasil fará com que o sistema financeiro brasileiro, altamente sofisticado, descubra formas de burlar os controles, disfarçando a entrada de capitais para investimento em renda fixa como operações para aplicação em renda variável.
Para lidar com esse problema, o governo brasileiro pode atuar em duas frentes. Em primeiro lugar, o CMN pode instituir a exigência de um requerimento não remunerado de depósito, da ordem de 20 a 30%, sobre todas as entradas de capitais (renda fixa, renda variável e investimento direto) ocorridas na economia brasileira pelo prazo de um ano. Em outras palavras, o governo deve adotar controles abrangentes à entrada de capitais no país, ao invés de controles seletivos como tem sido cogitado por alguns analistas econômicos.
Em segundo lugar, o governo brasileiro poderia ainda introduzir um "fundo de estabilização cambial" para atuar como "market-maker" no mercado de câmbio, comprando e vendendo dólares para induzir a cotação do câmbio para um patamar desejado pelo governo no longo prazo. Esse fundo deveria ser constituído com recursos do Tesouro Nacional. Uma proposta concreta nesse sentido seria aproveitar o existente Fundo Soberano Brasileiro, turbinando o mesmo por intermédio de um aporte significativo de recursos por parte do Tesouro Nacional. Uma vantagem de se utilizar recursos do Tesouro para a estabilização da taxa de câmbio é que isso não compromete a capacidade do BC em perseguir a meta inflacionária definida pelo CMN.
José Luis Oreiro é professor do Departamento de Economia da UnB e membro da Associação Keynesiana Brasileira (AKB). jlcoreiro@terra.com.br
Luiz Fernando de Paula é professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ e vice-presidente da AKB. luizfpaula@terra.com.br


Objetivo seria se aproximar da taxa dos países ricos
Reduzir a meta de inflação: uma boa ideia?
José Luis Oreiro e Luiz Fernando de Paula
18/08/2009
Existem poucas evidências em favor da tese de que a taxa de inflação deve ser a mesma para todos.
Alguns economistas ortodoxos estão lançando a ideia de que o Conselho Monetário Nacional (CMN) deve reduzir a meta de inflação a partir de 2011. O argumento fundamental é que a crise econômica mundial, ao atuar no sentido de reduzir as pressões inflacionárias latentes na economia brasileira em 2008, abre uma janela de oportunidade para que a taxa de inflação brasileira possa, no pós-crise, convergir para a média internacional. Sustenta-se que a convergência da taxa de inflação para a média mundial seja um objetivo desejável, cujos benefícios de longo prazo superariam em muito o custo que toda a desinflação (decorrente da requerida elevação, ainda que temporária, da taxa de juros) gera em termos de perda de produto e de emprego, pelo menos no curto prazo.
Os problemas causados pela inflação são claros quando a taxa de inflação é alta (superior a dois dígitos, por exemplo), pois recursos escassos da economia são alocados de forma ineficiente para o mercado financeiro, ocorre uma variação excessiva nos preços relativos, impõe-se um imposto inflacionário que recai majoritariamente sobre os mais pobres e, normalmente, inicia-se um processo cumulativo que pode levar à hiperinflação. No entanto, os custos da inflação não são tão claros quando a inflação é baixa, ou seja, para uma taxa de inflação de um dígito por ano. Com efeito, os estudos empíricos sobre os efeitos da inflação sobre o bem-estar não são conclusivos e, em alguns casos, apontam para a existência de uma relação positiva entre inflação e crescimento no longo prazo.
Os potenciais benefícios de uma inflação baixa incluem a facilitação dos ajustamentos no mercado de trabalho, pois, na medida em que os salários nominais são rígidos para baixo, a inflação permite que uma redução no salário real seja empreendida sem que haja cortes no nível de emprego. Alguma inflação também é importante para manter a economia distante de um problema ainda maior, a deflação, cujos efeitos nocivos sobre o sistema econômico foram mais do que comprovados pela Grande Depressão de 1929.
Deve-se mencionar que existem poucas evidências empíricas para suportar a tese de que países em desenvolvimento devam ter a mesma taxa de inflação que países desenvolvidos. A relação entre inflação e crescimento foi analisada a nível empírico por M. Sarel em "Nonlinear effects of inflation on economic growth" (IMF Staff Papers 43, 1996). Segundo esse autor, tomando-se uma amostra de países desenvolvidos e em desenvolvimento até 1990, pode-se mostrar a existência de uma relação não-linear entre inflação e crescimento, de tal forma que haveria uma relação positiva entre ambas as variáveis para níveis de inflação abaixo de 8% ao ano e uma relação fortemente negativa entre ambas a partir desse valor.
A metodologia de Sarel foi replicada por Padilha (2007) em sua dissertação de mestrado desenvolvida na Universidade Federal do Paraná. Tomando uma amostra de 55 países desenvolvidos e em desenvolvimento com dados até 2004, o trabalho em consideração tinha por objetivo reavaliar a relação entre inflação e crescimento do artigo de Sarel e discutir as diferenças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Os resultados apontam que, para o conjunto dos países em desenvolvimento, a taxa de quebra na relação entre crescimento e inflação é de 5,1%, ao passo que para os países desenvolvidos a relação de quebra se reduz apenas 2,1%. Os resultados são estatisticamente significativos e apontam uma diferença de cerca de três pontos percentuais entre a inflação "ótima" para países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Deve-se ressaltar que os resultados de Sarel, atualizados por Padilha, não justificam o inflacionismo, ou seja, o aumento deliberado e contínuo da taxa de inflação com vistas a se explorar o trade-off de curto prazo entre inflação e desemprego (via curva de Phillips). O que os resultados desses trabalhos parecem apontar é para a possibilidade de que a curva de Phillips de longo prazo seja negativamente inclinada abaixo de um certo nível crítico de inflação, tal como racionalizado recentemente em Thomas Palley ("The economics of inflation targeting: negatively sloped, vertical, and backward-bending Philips curves", 2006). Acima desse nível crítico de inflação, a curva de Phillips seria vertical, em consonância com boa parte da literatura teórica e empírica convencional sobre o tema. Dessa forma, bancos centrais devem ter um cuidado especial, principalmente nos países que adotam o regime de metas de inflação, com a fixação da meta de inflação de longo prazo, para não escolher o "trecho errado" da curva de Phillips de longo prazo.
Em função dessas considerações, acreditamos que a revisão da meta de inflação de 2011 para baixo de 4,5% ao ano não seja uma boa ideia. O regime de metas de inflação brasileiro precisa de uma série de reformas - substituição do índice cheio pelo core inflation, aumento do prazo de convergência da inflação para além do ano-calendário, adoção de cláusulas de escape, desindexação dos preços administrados, e extinção das LFT's para aumentar a eficácia da política monetária -, mas a redução da meta numérica de inflação não é uma delas.
Essas questões são examinadas no livro "Política Monetária, Bancos Centrais e Metas de Inflação: teoria e experiência brasileira", organizado por nós em conjunto com Rogério Sobreira (EBAPE/FGV) e publicado recentemente pela Editora da Fundação Getúlio Vargas. Nesse livro foram reunidos trabalhos acadêmicos de 23 economistas de diversas linhas teóricas e de diferentes centros de pesquisa e ensino de economia do país. A abordagem teórica adotada é eclética e plural, o que proporciona ao leitor um amplo panorama dos temas tratados por professores e pesquisadores brasileiros de diferentes instituições de ensino superior e de pesquisa do Brasil.
José Luis Oreiro é professor do Departamento de Economia da UnB e Membro da Associação Keynesiana Brasileira. E-mail: jlcoreiro@terra.com.br.
Luiz Fernando de Paulaé professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Uerj e Vice-Presidente da Associação Keynesiana Brasileira. E-mail: luizfpaula@terra.com.br.


Lance Taylor: Maynard's Revengeap april 2011



O capitalismo de hoje é um sistema orientado pelos dirigentes de empresas
Sociedade anônima, gerentes e a chave da crise mundial
Luis Fernando Vitagliano
04/08/2009
Se os gerentes perderam empregos, o efeito multiplicador desta casta, nada desprezível, complica a economia
Entender as origens, os desdobramentos e as consequências da atual crise do sistema financeiro é um trabalho que mal deixou de começar. Para o sucesso desta empreitada intelectual será necessário o empenho de muitos economistas e outros tantos cientistas sociais ao longo de anos. Já sabemos que muitas coisas irão mudar. Mas, infelizmente, os detalhes a respeito das mudanças, à parte todas as frases de efeito que por aí circulam, são ainda muito nebulosos para suposições precisas. Assim sendo, partamos do evidente para reflexões mais refinadas sobre os choques que a economia vem sofrendo desde meados de 2008.
Independente da época e do contexto, duas questões são fundamentais para empreender o capitalismo: trabalho livre e propriedade. Se olharmos a crise através destas duas óticas podemos incluir no debate questões importantes até então negligenciadas - porque as distintas formas pelas quais o trabalho e a propriedade se configuraram no decorrer da história é que diferencia um modo de produção de outro ou um capitalismo nacional de outro.
Ao recuperarmos a gênese dos estudos sobre a estrutura social do capitalismo, Marx expunha duas classes fundamentais: burguesia e proletariado. Independente de qualquer discussão a respeito da importância atual desta abordagem, temos que levar em consideração que a social-democracia europeia elevou a qualidade de vida do proletariado por meio de medidas do Estado de bem-estar social. Este fato transformou a mobilidade social numa realidade e acabou dando importância quantitativa e qualitativa às classes médias nos países desenvolvidos. Nos anos 80, observaram-se algumas mudanças nas ocupações: neomarxistas americanos (como Olin Wright ) fizeram estudos sobre a presença de gerentes e supervisores como uma categoria social não-proprietária, mas com poder de decisão sobre o trabalhador, comportando-se como patrões.
Tudo isso claramente sofreu o impacto oriundo das formas de acumulação, da geração de crescimento e da renda nacionais. Assim, podemos defender grosso modo que as mudanças na estrutura social vieram a partir de mudanças na estrutura de propriedade. E isso tem mudado bastante ao longo da história do capitalismo. Se observarmos a obra de Berle & Means (ainda em 1932) sobre as corporações, vemos que a estrutura da propriedade não condiz com o poder de decisão dentro da empresa. Ou seja: a grande empresa era um corpo autônomo que funcionava independente de seus donos. Enfim, já faz muito tempo que grandes proprietários não tomam para si a gestão dos negócios, converteram-se em acionistas que não acompanham o dia-a-dia da empresa.
No andar superior do capitalismo, onde se gestou, desenvolveu e eclodiu a crise, as relações de propriedade e decisão se complexificaram durante o Século XX. Muitos gerentes, consultores, supervisores e técnicos assumiram o papel da gestão das empresas e em troca disso ganharam salários exorbitantes, benefícios inacreditáveis e um estilo de vida de celebridade. Formou-se uma casta de managers que tem um padrão de consumo bastante elevado, fazendo movimentar o consumo e a expansão do sistema de cartão de crédito. Na crise, estes foram os primeiros "trabalhadores" ou não-proprietários a sentir seus efeitos. E se os gerentes perderam empregos ou tiveram seus contratos de trabalho restringidos, o efeito multiplicador desta casta, nada desprezível hoje, complica a economia.
Mas o mais grave não diz respeito aos ajustes imediatos que a crise tem gerado. A hipótese aqui defendida é que, se a crise for tão forte como o prometido, a organização capitalista das grandes corporações financeiras, caracterizada por gerentes que tomam conta da inovação organizacional das empresas, empenhados em otimizar resultados, trabalhar com metas e planejamento estratégico vai encontrar momentos de revisão.
A difusão da propriedade em papéis acionários chegou ao nível de complexidade que exige muita desregulação para gerar renda. Esta galinha dos ovos de ouro tem dado sinais de exaustão. Havia um equilíbrio entre as diretorias e conselhos que agora está prestes a ser rompido: ganhavam os acionistas com a valorização dos papéis, ganhavam os gerentes comendo uma fatia dos lucros através de seus bônus e benefícios. Não havia conflitos. Mas se o sistema financeiro mudar, muda também esta relação - e então: como vai ficar as possibilidades de equilíbrio entre gerentes e acionistas?
O capitalismo de hoje é um sistema orientado pelos gerentes. Esse elemento em perspectiva histórica é fundamental para entender a crise e seus desdobramentos. Foram as decisões dessas figuras-chave do sistema que elaboraram a mística desordem que levou à crise. Não é exceção considerar a dureza com que Obama tratou os diretores da GM. Agora, seu plano de ação para a regulação do sistema financeiro implica em monitorar empresas financiadoras e observar a geração de lucros através do controle de riscos. A crise pode ter atingido os laços que mantinham unidos gerentes e seus acionistas com aval da política financeira. Será forte o suficiente para fazer rever esta relação?
Respostas estão a desenhar-se. Mas, a sociedade anônima capitalista encontrou um grande dilema a superar: como lidar com os executivos escolhidos para administrar o patrimônio dos investidores? Mais: como fazer isso sem valorizar de modo exorbitante e irregular as ações das empresas?
Não vamos com isso demonizar pessoas ou posições. Porque enquanto todos ganhavam com a desordem, ela era boa e desejável. Mas agora que a busca desenfreada por bonança deve dar lugar ao bom senso, não faz sentido apontar bodes. Enquanto os governos se preocupam com o contágio e ainda não reforçaram as medidas para evitar novas crises, os efeitos das mudanças não nos são percebidos. Entretanto, quando as novas ordens fizerem-se fatos, é preciso estar atento porque a estrutura social pode mais uma vez nos revelar se há e qual o grau de mudança no sistema capitalista. Resta aguardar as respostas que só o tempo pode nos dar: a crise foi forte o suficiente para gerar impacto na estrutura social e no equilíbrio de gestão da propriedade capitalista?
Luis Fernando Vitagliano é doutorando em Ciência Política na área de Relações Internacionais, Unicamp.



Paul Krugman on the Prospects for Recovery
By Eric UhlfelderAugust 4, 2009
Paul Krugman is a professor of Economics and International Affairs at Princeton University, and the author or editor of 20 books and more than 200 papers in professional journals and edited volumes. His field of expertise is in international trade and finance, with his current academic research focused on economic and currency crises. Mr. Krugman also writes for a broader public audience, including his Op-Ed columns for the New York Times, Foreign Affairs, and Scientific American. Professor Krugman received the 2008 Nobel Prize in Economics.
We interviewed professor Krugman on July 25, 2009.Will we be ultimately better or worse off as a result of the government’s massive stimulus spending?It’s helpful to think about this question from a national point of view. The money funding our deficit spending will come from eventual increased economic output. It’s not coming at the expense of private investment. By making the economy stronger, it’s actually promoting private investment. So the stimulus doesn’t make us poorer, but richer as a nation in the long run.
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Aug 11, 2009
Paul Krugman and Charlie Stross
A few passages from a much longer discussion between Paul Krugman and science fiction author Charlie Stross (via):
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Op-Ed Columnist
Averting the Worst
By PAUL KRUGMAN
Published: August 9, 2009
So it seems that we aren’t going to have a second Great Depression after all. What saved us? The answer, basically, is Big Government.
Just to be clear: the economic situation remains terrible, indeed worse than almost anyone thought possible not long ago. The nation has lost 6.7 million jobs since the recession began. Once you take into account the need to find employment for a growing working-age population, we’re probably around nine million jobs short of where we should be.
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11/08/2009
Evitando o pior: o Grande Governo nos salvou de uma nova Grande Depressão
Nw York Times
Então, ao que parece, nós afinal não teremos uma segunda Grande Depressão. O que foi que nos salvou? A resposta é, basicamente, o Grande Governo.
Apenas para esclarecer: a situação econômica continua terrível. Ela está de fato pior do que, não faz muito tempo, alguém imaginaria ser possível. Os Estados Unidos perderam 6,7 milhões de empregos desde o início da recessão. Ao considerarmos a necessidade de encontrar emprego de uma população crescente em idade de trabalho, constatamos que há provavelmente nove milhões de empregos a menos do que o necessário.
E o mercado de trabalho ainda não deu a volta por cima - aquela queda diminuta do índice de desemprego no mês passado foi provavelmente uma anomalia estatística. Não atingimos ainda aquele ponto a partir do qual as coisas passam realmente a melhorar. Por ora, tudo o que temos para comemorar são os indícios de que a situação está piorando de maneira mais lenta.
Porém, apesar de tudo, os mais recentes relatórios econômicos indicam que a economia afastou-se vários passos da beira do abismo.
Há alguns meses a possibilidade de queda no abismo parecia bem real. O pânico financeiro do final de 2008 foi tão grave, sob certos aspectos, quanto o pânico do setor bancário no início da década de 1930, e, por algum tempo, indicadores econômicos fundamentais - o comércio internacional, a produção industrial global, e até mesmo os preços das ações - estavam caindo tão rapidamente ou de forma mais veloz do que em 1929 e 1930.
Mas na década de 1930 as curvas descendentes continuaram caindo. Desta vez, o mergulho parece ter chegado ao fim após apenas um ano terrível. Sendo assim, o que foi que nos salvou de uma reedição integral da Grande Depressão? A resposta, sem dúvida, reside no papel muito diferente desempenhado pelo governo.
Provavelmente, o aspecto mais importante do papel do governo nesta crise não foi aquilo que ele fez, mas sim o que deixou de fazer: ao contrário do setor privado, o governo federal não cortou os gastos à medida que os seus rendimentos caíam (os governos estaduais e municipais são uma outra história). A arrecadação tributária está bem menor, mas os cheques do Social Security continuam sendo emitidos; o Medicare ainda cobre as contas hospitalares; os funcionários públicos federais, de juízes a guardas florestais e soldados ainda recebem os seus salários.
Tudo isso ajudou a apoiar a economia nesta época de necessidade, de uma maneira que não ocorreu em 1930, quando os gastos federais representavam uma percentagem muito menor do produto interno bruto. E, sim, isso significa que os déficits orçamentários - que são algo de ruim em tempos normais - são na verdade um fator positivo neste momento.
Além de provocar esse efeito estabilizador "automático", o governo interveio para salvar o setor financeiro. Você pode argumentar (e eu argumentaria) que os pacotes de socorro às firmas financeiras poderiam e deveriam ter sido mais bem administrados, e que o contribuinte pagou demais e recebeu muito pouco. Mas é possível ficar insatisfeito, e até mesmo furioso, com a forma como esses pacotes de auxílio financeiro funcionaram e ao mesmo tempo reconhecer que sem tais pacotes a situação estaria muito pior.
O fato é que, desta vez, ao contrário do que ocorreu na década de 1930, o governo não adotou uma postura de não envolvimento enquanto o sistema bancário entrava em colapso. E este é um outro motivo pelo qual não estamos vivenciando uma Grande Depressão II.
E o último fator, e provavelmente o menos importante, mas de forma alguma trivial, foram os esforços deliberados do governo no sentido de fortalecer a economia. Desde o princípio eu argumentei que a Lei de Reinvestimento e Recuperação Norte-Americana, mais conhecida como plano de estímulo de Obama, era muito modesta.
Apesar disso, estimativas razoáveis sugerem que hoje há um milhão a mais de norte-americanos empregados do que haveria sem esse plano - um número que crescerá no decorrer do tempo - e que o estímulo desempenhou um papel significante para tirar a economia da queda livre em que se encontrava.
Então, no fim das contas, o governo desempenhou um papel estabilizador crucial nesta crise econômica. Ronald Reagan estava errado: às vezes o setor privado é o problema, e o governo é a solução.
E atualmente você não está satisfeito pelo fato de o governo ser controlado por gente que não odeia o governo?
Nós não sabemos quais seriam as políticas econômicas de um governo McCain-Palin. Sabemos, todavia, o que os republicanos na oposição estão dizendo - e o discurso deles resume-se a exigir que o governo deixe de impedir uma possível depressão econômica.
Não estou falando apenas sobre a oposição ao estímulo financeiro. Republicanos proeminentes querem acabar também com estabilizadores automáticos. Em março, John Boehner, o líder da minoria da Câmara, declarou que, como as famílias estão sofrendo, "é hora de o governo apertar o cinto e mostrar ao povo norte-americano que os políticos 'entenderam' a situação". Felizmente, o conselho dele foi ignorado.
Eu ainda estou muito preocupado com a economia. Temo que ainda exista uma possibilidade substancial de que o desemprego continue alto por muito tempo. Mas ao que parece nós evitamos o pior: a impressão que se tem é de que uma total catástrofe não é mais um cenário provável.
E o Grande Governo, administrado por gente que entende as suas virtudes, é o motivo disso.
Paul Krugman
Professor de Princeton e colunista do New York Times desde 1999, Krugman venceu o prêmio Nobel de economia em 2008





CLÓVIS ROSSI - 15-08-09
As "fast" teorias, ilusóriasSÃO PAULO - Não é que a França já saiu da recessão? Como, se não faz tanto tempo assim era acusada de esclerosada, de excessivamente "étatiste", parte do que chamavam de "velha Europa", como contraponto aos países ex-comunistas, atacados do frenesi capitalista próprio dos recém-convertidos? Não eram os Estados Unidos o modelo da modernidade, da inventividade, da produtividade, da expansão econômica infinita? Como é que a França ousa sair da recessão antes dos Estados Unidos? Pior, do ponto de vista dos fundamentalistas de mercado, os Estados Unidos só não afundaram mais e só estão pondo alguns fios de cabelo fora d'água graças à mais formidável pilha de dinheiro jamais mobilizada na história deste país (digo, daquele país) para salvar o mercado. Ah, a Alemanha saiu igualmente do fundo do poço, com todo o seu modelo, também muito pendurado no Estado. Ah, e o Reino Unido? Não saiu, não, embora seja, desde o reinado Margaret Thatcher (1979/1990), a vice-campeã mundial do neoliberalismo. Só estou citando esses fatos para voltar ao texto de anteontem nesta Folha de Mohamed El-Erian, um desses deuses do mercado, que ironizava a gangorra nas análises sobre o descola/não descola entre as economias emergentes e as do mundo rico. Para voltar também a Ruy Castro que, na quarta-feira, dizia: "Fast food é junk food, como se sabe, e há uma relação óbvia entre junk food e junk music: se as pessoas comessem a música que a mídia lhes serve para ouvir, já estariam mortas há muito tempo". Pois é, Ruy, se as pessoas comessem as "fast" teorias econômicas que os indefectíveis analistas lhes servem para entender o mundo, entenderiam tudo errado. Não é hora de dar um "slow motion" na elaboração afobada de modelos e teorias?

MOHAMED EL-ERIAN - folha, 13-08-2009
A volta da teoria do descolamento
VOCÊ SE lembra de Statler e Waldorf, os velhinhos do "Muppet Show" que insultavam os artistas de seu camarote no teatro? Eles tagarelam até inverter a posição inicial e depois retornam a ela, primeiro elogiando uma apresentação, depois criticando e por fim voltando a elogiar.
Essa viagem de ida e volta me lembra o debate sobre descolamento e novo acoplamento. Especificamente, embora o descolamento seja realidade, as dimensões internacionais são mais nuançadas do que as análises tradicionais sugerem. Como resultado, as implicações da questão para o investimento e a política econômica estão sofrendo distorção.
Os defensores do descolamento estavam por cima nas semanas que antecederam a "morte súbita" da economia mundial nos três meses e meio finais de 2008. O crescimento dos mercados emergentes era forte, e as garantias oferecidas por grandes e crescentes reservas cambiais isolavam muitos deles das perturbações que o setor financeiro norte-americano estava sofrendo. Como resultado, o consenso do mercado estava inclinado a ver as economias emergentes cada vez mais como propulsoras do crescimento mundial.
Os defensores da ideia de novo acoplamento retomaram a vantagem em outubro, quando a quebra do Lehman Brothers paralisou o financiamento do comércio global. A caracterização de consenso para os emergentes se inverteu -em lugar de locomotivas de crescimento, eles se tornaram reboques-, à medida que sofriam contrações superiores às dos países desenvolvidos.
Com a normalização do sistema financeiro que está em curso, os defensores do descolamento voltam a estar em forte ascensão. A posição deles é reforçada pela recuperação na atividade econômica dos países em desenvolvimento e pelo fato de que as avaliações de suas ações agora superam o nível que mantinham antes da quebra do Lehman Brothers.
Para alguns, essa viagem de idade e volta ilustra a fragilidade dos consensos de mercado. Outros a consideram como indicativa da fluidez de uma economia globalizada que está experimentando choques cíclicos e realinhamentos seculares. Para mim, ela é um importante lembrete de que é preciso trabalhar de maneira muito mais específica nas análises -e essa abordagem confirma que o descolamento existe, mas qualifica os efeitos decorrentes.
Algumas notáveis economias emergentes (entre as quais Brasil, China e Índia) saem da crise com a capacidade de sustentar crescimento de médio prazo superior ao dos países industrializados. Isso reflete as condições financeiras mais fortes, a maior flexibilidade da política econômica e o impacto benéfico de fase de desenvolvimento acelerado com alguns anos de duração. Por isso, elas oferecem aos investidores o potencial de retornos mais atraentes.
No geral, embora a contribuição dos emergentes ao crescimento mundial deva continuar a aumentar, eles ainda não estão em posição de agir como poderosa locomotiva para os países industrializados. Os efeitos de base continuam baixos e parte do crescimento se baseia em fatores transitórios, entre os quais o grande pacote de estímulo da China.
O crescimento nas economias emergentes não fará muito por aliviar aquilo que está rapidamente se tornando a principal questão de política econômica nos países industrializados -a saber, desemprego alto e crescente combinado a salários estagnados. De fato, à medida que a disparidade se alarga em favor dos mercados emergentes, os governos dos países industrializados devem enfrentar ainda mais pressão protecionista. Sua capacidade de resistir a ela cresceria caso os emergentes tomem medidas para acelerar a transferência do crescimento em sua demanda interna do setor público para o consumo privado.
MOHAMED EL-ERIAN é presidente-executivo e co-diretor de investimento da Pimco. Este texto foi publicado originalmente no "Financial Times". Tradução de PAULO MIGLIACCI



Mr Keynes and the moderns

Paul Krugman - 21 June 2011
Keynes’ General Theory is 75 years old. In this column, Paul Krugman argues that many of its insights and lessons are still relevant today, but many have been forgotten. A broad swath of macroeconomists and policymakers are applying old fallacies to today’s crisis. As the nostrums being applied by the “pain caucus” are visibly failing, Keynesian ideas may yet make a comeback.

Prepared for the Cambridge conference commemorating the 75th anniversary of the publication of The General Theory of Employment, Interest, and Money.



Keynes versus the Classics: Round Two
Thursday, 22 October 2009 08:52 Robert Skidelsky




Review of 'Keynes: The Return of the Master' - washingtonpost.com
By Carlos LozadaSunday, September 20, 2009
KEYNES
The Return of the Master
By Robert Skidelsky
PublicAffairs.
221 pp. $25.95
It's the quote that launched a thousand pats on the back.




How to rebuild a shamed subject
By Robert Skidelsky
Published: August 5 2009 19:47 Last updated: August 5 2009 19:47
It was to be expected that our present economic traumas would call into question the state of economics. “Why did no one see the crisis coming?”, Queen Elizabeth reportedly asked one practitioner. A seminar at the British Academy tried to answer and the FT has taken up the discussion.
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The Redemption of Keynes - BusinessWeek
Rediscovering the man whose ideas helped avert economic collapse
By Chris Farrell
Editor's Rating:
The Good: Two books, with different emphases, on the economist who helped us avoid a second Great Depression—both of which bring this important figure from the interwar period back into focus.
The Bad: Clarke's book looks into the rich details of Keynes' fascinating life story, but the work of explaining the present-day relevance of the man's theories is executed superbly by Skidelsky
The Bottom Line: Skidelsky, who previously wrote an acclaimed three-volume biography of Keynes, best sums up the resurgence of the economist's ideas and his importance in the ongoing debate over reforms
Reader Reviews
Keynes: The Return of the MasterBy Robert SkidelskyPublicAffairs; 221 pp; $25.95Keynes: The Rise, Fall, and Return ofthe 20th Century's Most Influential EconomistBy Peter ClarkeBloomsbury Press; 211 pp; $20
Thanks to extraordinary actions by the Federal Reserve, .. ... .. ... ... ... ... ... ....



Keynes: The Return of the Master by Robert Skidelsky
The great economist's theories have never been more relevant – and his biographer remains their most compelling advocate, says Paul Krugman
Paul Krugman
At research seminars, people don't take Keynesian theorising seriously anymore; the audience starts to whisper and giggle to one another." So declared Robert Lucas of the University of Chicago, writing in 1980. At the time, Lucas was arguably the world's most influential macroeconomist; the influence of John Maynard Keynes, the British economist whose theory of recessions dominated economic policy for a generation after the Second World War, seemed to be virtually at an end.
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LUIZ GONZAGA BELLUZZO - folha 18-10-09
O retorno do mestreSkidelsky mostra, em nova obra, que a crítica de Keynes ao capitalismo liberal era menos radical do que parece
DIZEM POR aí que Keynes voltou à moda. Autor de três volumes sobre a vida e obra do célebre economista, Robert Skidelsky entregou à praça recentemente o livro "The Return of the Master". Digo ao leitor que o livro, um ensaio, nos apresenta um Keynes mais revolucionário e inovador do que revelado na alentada biografia. Nos três magníficos volumes da biografia, Skidelsky cuidou de demonstrar que a crítica de Keynes ao capitalismo liberal era menos radical do que parece. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ..



OS BALANÇOS E PROMESSAS DE 2012


por Luiz Gonzaga Belluzzo - Valor Econômico, 03-01-2012




HETERODOX ECONOMICS


Marginal revolutionaries
The crisis and the blogosphere have opened mainstream economics up to new attack




Cenário externo permite mudar mix de política econômica


Por Chico Santos | Do Rio
O economista Luiz Fernando de Paula sugere mudar a periodicidade de cálculo da inflação anual acumulada para efeito de cumprimento da meta oficial
Valor Econômico, 27-12-2011



09-22-2009 17:23
Is Stimulus Still Necessary?
By Robert Skidelsky
LONDON ― Have stimulus packages brought the world's traumatized economies back to life? Or have they set the scene for inflation and big future debt burdens? The answer is that they may have done both. The key question now concerns the order in which these outcomes occur.
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25/11/2008 - 14h56
O retorno de Keynes
...No momento, nós simplesmente não sabemos; e nenhuma "técnica bela e educada" nos fornecerá a resposta. Robert Skidelsky é autor do livro "John Maynard Keynes 1883-1946) http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/prospect/2008/11/20/ult2678u193.jhtm



O retorno do mestreAssis Moreira
24/09/2009
Se há alguém especialmente cético sobre a cúpula do G-20, que ocorre hoje e amanhã em Pittsburgh (EUA), é Lord Skidelsky, ou professor Robert Skidelsky, reputado por sua biografia de John Maynard Keynes, obra considerada magistral também por quem não aprecia o mestre da macroeconomia e co-arquiteto do sistema monetário de Bretton Woods no pós-guerra.
O lorde britânico e professor da Universidade de Warwick, 70 anos de idade, dos quais 40 consagrados ao estudo de Keynes, acaba de publicar um novo livro, intitulado "The Return of the Master". De passagem por Genebra, ele conta que já assinou o contrato para a versão em português e que tem um forte sentimento: "Acho que estou certo sobre o retorno de Keynes."
Para Skidelsky, a dramática crise atual destruiu a crença em expectativas racionais e eficiência dos mercados. E vê a volta do keynesianismo não só ilustrada com as intervenções de trilhões de dólares feitas pelos governos para estimular a economia e capitalizar os bancos, como em novas orientações governamentais.
Mas insiste que do G-20 de Pittsburgh só se pode esperar "alguns barulhos interessantes" sobre diversos temas, e nada de concreto sobre uma reforma econômica global, para evitar que da crise atual se passe à próxima crise. Estima que enquanto o poderio do dólar americano não tiver sido desmantelado, nenhuma reforma fundamental para reequilibrar a economia mundial é possível.
Skidelsky nota que o desastre financeiro atual começa a produzir ajustes na economia que os líderes políticos evitavam até agora. Os americanos estão tendo de gastar menos e poupar mais e o declínio de suas exportações força os chineses a dar ênfase no crescimento através do desenvolvimento doméstico. A fragilização da economia americana produziu um declínio automático no valor do dólar em relação a outras moedas.
Mas, ao seu ver, o problema com a agenda de reforma em discussão - por exemplo, para chineses e outros países da Ásia do Leste consumirem mais, investirem mais e terem taxas de câmbio mais flexíveis - é que coloca todo o ônus sobre a China e o Leste da Ásia e nada sobre "detentores do poder" nos EUA. O argumento de que os americanos consomem acima de seus meios é "muito vago para ser útil". As classes média e baixa americanas tiveram acesso ao crédito além do que podiam. Mas a simbiose consumo dos EUA-poupança da China tem sido "excelente para os lucros das empresas americanas". Considera que os empresários dos EUA têm sido "cúmplices" na supercompetitividade chinesa, ao transferir empregos industriais bem pagos para a China a fim de cortar gastos.
Acima de tudo, acrescenta o professor, o gigantesco déficit em contas correntes permitiu aos EUA financiar suas "pretensões imperiais". Em 1968, o líder francês general De Gaulle se alarmava contra o "exorbitante privilégio" americano de imprimir dinheiro, tanto para consumir mercadorias como para pagar por gastos militares no exterior, sem ter de taxar seus cidadãos para isso.
Lord Skidelsky dá um passeio pela história para ilustrar como o dólar se tornou hegemônico. No regime de ouro antes de 1914, não emergia desequilíbrio global. "A podridão", como diz, começou com a conferência de Gênova de 1922, que permitiu aos países deter parte de suas reservas numa moeda forte, como a libra esterlina ou o dólar. O tratado de Bretton Woods, de 1944, adaptou a proposta por taxas cambiais fixas, mas ajustáveis, mas não conseguiu impor um remédio contra o acúmulo de superávits pelos países. Em todo caso, o privilégio do dólar americano na época acomodou todo mundo, porque os europeus podiam exportar com taxa cambial desvalorizada para os EUA e Washington cobria seus custos na defesa da Europa Ocidental. O "privilégio exorbitante" permitiu aos EUA continuar sua "missão imperial" na Guerra Fria, para satisfação de parceiros e aliados.
A posição privilegiada do dólar sobreviveu ao colapso do regime de câmbio fixo, em 1971. Skidelsky nota que, na teoria, a taxa flutuante removia a necessidade de reservas, na medida em que o ajuste nos desequilíbrios de contas correntes deveria ser automático. Mas a necessidade de reservas "sobreviveu de forma inesperada", sobretudo para se proteger de movimentos especulativos de "hot money" que desviavam a taxa cambial do valor de equilíbrio. Os EUA continuaram a ter os benefícios políticos de direitos de "senhoriagem" do dólar americano. "Todo historiador sabe que uma moeda hegemônica é parte de um sistema imperial de relações políticas", diz o lorde britânico. Para ele, os EUA aceitaram moeda desvalorizada na Ásia, da qual hoje reclamam, porque isso assegurava persistência de relações políticas desequilibradas.
Agora, Washington diz querer, no G-20, um reequilíbrio global. Lord Skidelsky mostra-se cético. Uma reforma nessa direção depende da disposição americana de aceitar de fato, e não apenas na retórica, um mundo mais plural, outros centros de poderes, na Europa, China, Japão, América Latina e Oriente Médio, assumindo responsabilidade por sua própria segurança, e uma nova ordem mundial com regras do jogo negociadas, e não impostas, para combater as mudanças do clima, terrorismo, abuso de direitos humanos etc.
Lord Skidelsky, que não é exatamente fiel em política - passou do Partido Trabalhista para o Social-Democrata, depois para o Conservador, e agora é do grupo independente na Câmara dos Lordes - apoia uma sugestão do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, de "trigger points" (gatilhos) em caso de desequilíbrios em contas correntes. É algo no espírito da proposta da International Clearing Union, de Keynes, pela qual haveria reciprocidade no ajustamento de balanço de pagamentos, com sanções sobre os países deficitários e superavitários.
"Mas isso está longe de ser um plano", reconhece. O "crash" financeiro mostrou a necessidade de realinhamento econômico, mas isso não ocorrerá até que os EUA renunciem a sua missão imperial, o que exige "um gigantesco realinhamento mental nos EUA". E isso não parece ser para tão cedo, admite o fiel discípulo de Keynes.
Assis Moreira é correspondente em Genebra
E-mail: assis.moreira@valor.com.br


Aug 15, 2009
"Keynes was Really a Conservative" - link
Bruce Bartlett argues that the conservative position that governments "do nothing in the face of the greatest economic downturn since the Great Depression" would endanger the very thing free market ideologues are trying to preserve, the capitalist system itself. This was something that Keynes understood very well. .... .... .... ..... ... [com comentários.... vários... .... .. ]





Op-Ed Contributors
The Recession Is Over — for Now
By PETER BOONE and SIMON JOHNSON
Published: September 19, 2009
SPEAKING at the Brookings Institution last week, the chairman of the Federal Reserve, Ben Bernanke, remarked that the recession in the United States is “very likely over.” He’s surely right that a recovery is under way; in fact, the short-term bounce back may actually turn out to be faster than he thinks — rapid growth is not uncommon right after a severe financial crisis.
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How I Became a Keynesian
Second Thoughts in the Middle of a Crisis
Richard Posner
September 23, 2009 12:00 am 5 comments
Until last September, when the banking industry came crashing down and depression loomed for the first time in my lifetime, I had never thought to read The General Theory of Employment, Interest, and Money, despite my interest in economics. I knew that John Maynard Keynes was widely considered the greatest economist of the twentieth century, and I knew of his book's extraordinary reputation. But it was a work of macroeconomics--the study of economy-wide phenomena such as inflation, the business cycle, and economic growth. Law, and hence the economics of law--my academic field--did not figure largely in the regulation of those phenomena. And I had heard that it was a very difficult book, which I assumed meant it was heavily mathematical; and that Keynes was an old-fashioned liberal, who believed in controlling business ups and downs through heavy-handed fiscal policy (taxing, borrowing, spending); and that the book had been refuted by Milton Friedman, though he admired Keynes's earlier work on monetarism. I would not have been surprised by, or inclined to challenge, the claim made in 1992 by Gregory Mankiw, a prominent macroeconomist at Harvard, that "after fifty years of additional progress in economic science, The General Theory is an outdated book. . . . We are in a much better position than Keynes was to figure out how the economy works."
.... .... ..... ..... .... ..... ...... ... 3 págs..


October 23, 2009 15 comments
Does Economics Violate the Laws of Physics?
By Nathanial Gronewold




December 30, 2009
2009: The Year of Doom
An easy way to take the pulse of 2009 is to look at what people have been reading over the past year. Alan has already talked about books, so I'll take a look at newspapers.
Yesterday, the FT posted its most read opinion pieces of 2009. Which author is on top?
Nouriel Roubini. Twice.
The two most read FT opinion articles of 2009 were Roubini's "The mother of all carry trades faces an inevitable bust" (which I discussed here), and "The risk of a double-dip recession is rising". Other popular pieces included John Taylor's "Exploding debt threatens America" (#4) and Niall Ferguson's "A history lesson for economists in thrall to Keynes" (#8).
It's safe to say that 2009 has been a year in which doom was in vogue.
The naguthties (or is it noughties, or oughties?) began on a dot-com crescendo. They ended with an insatiable appetite for bad news.
So what's in store for the next decade? If the financial media is any guide, 2010 is not beginning on an upbeat note. The lead editorial in today's FT is by Paul Kennedy, a man who was been preaching doom since Roubini was in diapers.
Let's hope he doesn't make it into next year's top ten.
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Keynesianismo vulgar e o Novo-desenvolvimentismoPor Luiz Carlos Bresser-Pereira e
José Luis Oreiro
05/02/2010
Recentemente temos observado uma associação indevida entre o "Novo-desenvolvimentismo" - entendido como o conjunto de ideias, instituições e políticas pelas quais os países de renda média tentam alcançar o nível de renda per capita dos países desenvolvidos - com o que poderíamos chamar de "Keynesianismo vulgar", ou seja, a ideia segundo a qual a ocorrência de déficits fiscais crônicos e crescentes são necessários para a manutenção do "pleno emprego" da força de trabalho. De acordo com os defensores dessa associação, o "Novo-desenvolvimentismo" seria caracterizado pela adoção de políticas deliberadas no sentido de aumentar o déficit fiscal como forma de promover o emprego, a equidade social e o aumento do padrão de vida da população. Nesse contexto, a defesa da "austeridade fiscal" por parte de alguns economistas que se intitulam "Novo-desenvolvimentistas" seria, na verdade, uma confissão de submissão à ortodoxia econômica e ao Neo-liberalismo. Além disso, argumentam os proponentes dessa ideia, a "austeridade fiscal" é, per se, incompatível com a macroeconomia keynesiana, a qual estabelece que os déficits fiscais são necessários para a obtenção do pleno-emprego numa economia capitalista.
A ideia de que a defesa dos déficits fiscais crônicos e crescentes como forma de proporcionar o pleno emprego da força de trabalho encontra respaldo nos escritos de John Maynard Keynes é totalmente incorreta. Como bem ressaltado por Bradley Bateman num ensaio recente sobre "Keynes e o Keynesianismo" (2006), publicado pela Cambridge University Press, a associação do nome de Keynes com o "populismo fiscal" se deveu a dois economistas liberais, Buchanan e Wagner, num livro publicado em 1976, intitulado "Democracy in deficit: the political legacy of Lord Keynes". Nesse livro, cujo objetivo era atacar as bases do "Estado do Bem-Estar Social" construído no pós-segunda guerra mundial, os autores fazem uma caricatura das ideias de Keynes, associando as mesmas ao descontrole fiscal, à inflação e ao alto desemprego que se observavam nos países desenvolvidos após o colapso do sistema de Bretton Woods e o primeiro choque do petróleo.
No entanto, como bem ressalta Bradley, Keynes era avesso ao uso indiscriminado de déficits fiscais para estimular a economia. Com efeito, a política fiscal que Keynes preconizava se baseava na separação entre os orçamentos corrente e de capital do governo. O orçamento corrente deveria estar continuamente equilibrado, independente do estado no qual a economia se encontrasse. O papel de política fiscal anticíclica caberia, portanto, ao orçamento de capital no qual seriam contabilizadas as despesas discricionárias com projetos de investimento e as receitas proporcionadas pelos mesmos. Ao longo de uma sequência de períodos, o orçamento de capital deveria estar equilibrado com as receitas dos projetos de investimento anteriormente realizados cobrindo os novos gastos de investimento, tal como ocorre num "fundo rotativo". O orçamento de capital poderia, no entanto, apresentar déficits pontuais nos anos em que fosse necessário estimular a economia com gastos adicionais de investimento.
Mais importante do que os déficits pontuais no orçamento de capital, contudo, seria o papel da "socialização do investimento", ou seja, o aumento da participação do Estado na formação bruta de capital fixo, para a estabilização dos ciclos econômicos. Como Keynes acreditava que os ciclos econômicos eram o resultado das flutuações do investimento causadas pela mudança do "estado de ânimo" dos empresários, a "socialização do investimento" atuaria no sentido de reduzir a amplitude das flutuações do investimento, contribuindo assim para estabilizar a economia.
O Novo-desenvolvimentismo tem como um de seus fundamentos teóricos a macroeconomia keynesiana. Dessa forma, a estabilização da economia na visão do novo-desenvolvimentismo deve ser feita, tal como para Keynes, pela "socialização do investimento". Para o Novo-desenvolvimentismo, os déficits fiscais devem ser evitados fundamentalmente porque enfraquecem a capacidade do Estado de conduzir de forma autônoma a política macroeconômica; ou seja, diminuem a sua capacidade de conduzir a política monetária e a política cambial de forma independente dos interesses dos rentistas. Com efeito, um Estado endividado é um Estado que fica refém dos interesses do sistema financeiro, uma vez que aquele fica dependente do financiamento da dívida pública, a qual é intermediada pelos bancos. Os expoentes do "keynesianismo vulgar" irão rebater essa ideia dizendo que o Estado tem sempre a opção de financiar seus déficits com emissão de moeda, de forma que a existência de déficits públicos per se não é incompatível com a autonomia da política monetária e cambial. O problema é que essa solução é altamente inflacionária, a não ser em períodos nos quais a economia apresente subutilização aguda de capacidade produtiva. Em condições normais de utilização de capacidade, a emissão monetária requerida para o financiamento de déficits públicos da ordem de 2% a 4 % do PIB irá produzir um aumento colossal da demanda agregada, tornando impossível o ajuste da oferta agregada sem aumento considerável da taxa de inflação.
A redução da capacidade do Estado de conduzir de forma autônoma a política macroeconômica é ainda maior quando o endividamento do setor público, além de elevado como proporção do PIB, é fundamentalmente de curto prazo. Esse é precisamente o caso brasileiro. Apesar do tão propalado "ajuste fiscal" que teria sido feito após a implantação do atual tripé de política macroeconômica - metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário - o fato inconteste é que não só o Estado brasileiro continua apresentando elevado déficit operacional (igual a 2,52% do PIB no acumulado em 12 meses até novembro de 2009) como a sua postura financeira é eminentemente Ponzi, uma vez que o superávit primário é insuficiente sequer para pagar os juros referentes à dívida bruta do setor público. Devido ao prazo reduzido de vencimento da dívida pública, os juros e as amortizações superam em mais de cinco vezes o superávit primário. Essa elevada fragilidade financeira Minskiana torna o Estado brasileiro extremamente suscetível à mudança de humor dos compradores de títulos públicos, os quais podem, a qualquer momento, sabotar políticas macroeconômicas com as quais não concordem recusando o refinanciamento da dívida pública.
Luiz Carlos Bresser-Pereira, professor emérito da Fundação Getúlio Vargas/São Paulo.
José Luis Oreiro, professor-adjunto do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.



Investigação do comportamento dinâmico dos coeficientes da curva de Phillips Novo Keynesiana no Brasil e a importância da globalização comercial
Almeida, Leonardo Porto de
Nos últimos tempos a literatura empírica tem reportado inúmeras evidências relativas à alterações dos coeficientes da curva de Phillips Novo Keynesiana em diversas economias, dentre as quais reduções dos impactos da inércia inflacionária, do hiato do produto, da inflação importada e elevação do coeficiente das expectativas de inflação. Neste contexto, uma parte da literatura tem atribuído à maior globalização comercial entre as economias uma das principais causas para algumas dessas evidências. O presente trabalho teve como objetivo investigar uma parte deste extenso debate aplicando-o aos dados da economia brasileira. Especificamente, os dois principais objetivos deste trabalho foram: i) investigar se a dinâmica inflacionária da economia brasileira sofreu alguma alteração nos últimos anos em termos de mudanças das magnitudes dos coeficientes da Curva de Phillips Novo Keynesiana; ii) avaliar se a maior globalização comercial da economia brasileira ocorrida ao longo das duas últimas décadas exerceu alguma influência sobre os coeficientes da Curva de Phillips Novo Keynesiana. Ressalta-se que os resultados apresentados para esse segundo objetivo sempre levaram em consideração o significativo aperfeiçoamento da condução da política monetária na economia brasileira desde a implantação do regime de metas de inflação. Com relação ao primeiro objetivo as evidências deste trabalho apontaram que há indicações de redução dos coeficientes da inércia inflacionária e da inflação importada concomitante à elevação do coeficiente das expectativas de inflação. Neste sentido, não se evidenciou alterações significativas no coeficiente do hiato do produto. No tocante ao segundo objetivo, os resultados sugeriram que o aumento da credibilidade tende a reduzir os coeficientes da inércia inflacionária, do hiato do produto e da inflação importada ao mesmo tempo em que eleva o coeficiente das expectativas de inflação. Finalmente, a importância da maior globalização comercial mostrou-se restrita ao coeficiente da inflação importada na direção de ampliá-lo.



O eterno retornoAntonio Delfim Netto
09/02/2010
Os economistas estão perdendo tempo tentando "explicar" a crise financeira de 2008 com modelos econômicos sofisticados e misteriosos métodos econométricos. Henry Paulson, secretário do Tesouro do presidente Bush, disse, ao tomar posse, que "vinha para passar uma borracha sobre o que restava do controle financeiro construído no passado". O "passado" era o pacote de medidas postas em prática no governo de Roosevelt: 1) o "Securities Act", de 27 de maio de 1933; 2) o "Glass-Steagall Act", de 16 de junho do mesmo ano; e 3) o "Securities Exchange Act", de 6 de junho de 1934. Medidas que foram, em parte, sugeridas pelas conclusões do famoso "Relatório Pecora", onde se demonstraram os efeitos trágicos da mitologia que o sistema financeiro, deixado a si mesmo, respeitava a moralidade, era capaz de "autorregular-se" e de garantir o patrimônio que o público lhe confiava.
Todas as investigações para entender o que se passou em 2008 são desnecessárias e, na melhor das hipóteses, pura tolice. Procuram a causa do fenômeno no lugar errado: 1) a má formação das instituições que controlam o sistema financeiro e os incentivos perversos que os dominam; e 2) insistem na imoralidade ínsita no comportamento dos grandes operadores de Wall Street. O próprio Paulson que, na suposição mais benéfica, foi apenas uma testemunha inocente, que se encontrava desavisadamente no local do crime, apontou a "verdadeira" causa da tragédia: o governo inglês, que vetou a compra do Lehman Brothers pelo Barclays, que passou muito apertado no decorrer da crise e foi salvo por um fundo árabe...
Henry Paulson pode ter sido um bom banqueiro, que internalizou o espírito do tempo: o sistema financeiro observaria escrupulosamente o "imperativo categórico" kantiano e seria capaz de autorregular-se, dispensando a "tutela do Estado". Esta apenas aumentaria o custo de transação e reduziria a produtividade e a eficiência do sistema. Ele sabia disso por experiência própria e bem vivida: foi presidente da Goldman Sachs por oito anos, antes de ser promovido a secretário do Tesouro dos EUA! Certamente ele tem outros méritos. É um dedicado conservador e um dos grandes financiadores do Partido Republicano...
Infelizmente, quando propôs sua solução para o problema do Lehman, mostrou ignorar uma equação química elementar: banco podre + banco podre = banco podre ao quadrado.
É claro que a crise de 2008 não foi obra apenas de Paulson, mas da insana e sistemática eliminação das restrições impostas, como consequência da grande crise de 1929, ao sistema financeiro americano no primeiro quinquênio dos anos 30 do século passado. A desmontagem começou em 1980, com o "The Depository Institutions Deregulation and Monetary Control Act" no governo democrata, de J. E.Carter (1977-81). Terminou com o "Gramm-Leach-Bliley Act", de 1999, no governo democrata de Clinton. Houve liberação geral! Voltou-se à situação anterior ao "Glass-Steagall Act", que incorporara alguns resultados das investigações do Congresso americano.
Este tem uma tradição de 200 anos na investigação de problemas nacionais agudos. A primeira foi em 1792. Em 1932, o Senate Banking Committee começou a investigar a grande crise, com pífios resultados. Poucas semanas antes de terminar seu prazo, o Senado contratou Ferdinand Pecora (procurador da cidade de Nova York) para completar o trabalho. Ele pediu permissão para novas oitivas e obteve mandados de busca nos maiores bancos, executados por auxiliares competentes.
No depoimento de Charles Mitchel (chairman da National City Company), ele foi confrontado com fatos que o obrigaram a confessar que o City transferia seus investimentos próprios mal sucedidos para os seus clientes menos prevenidos, o que o levou a demitir-se. Descobriu-se, também, que ele sonegava imposto de renda. Foi processado por evasão fiscal. Em maio de 1933, o Banking Committee ouviu o poderoso banqueiro J.P.Morgan Jr., que saiu devidamente depenado de sua arrogância e, diante das evidências, confessou suas "artes".
O Relatório Pecora fez uma autópsia do sistema financeiro americano no início dos anos 30:
1) ele produziu uma "orgia" especulativa ao longo dos anos 20. Os banqueiros e o Fed foram acusados pelo Congresso de desviar os recursos que deviam aplicar no sistema produtivo para financiar a "bolha" da bolsa americana e de se aproveitarem de "insiders" para benefício próprio;
2) realizou vendas fraudulentas de ações novas. Quando houve a quebra, ficou provado que nada valiam. Alguns "underwritings" eram claramente criminosos, porque os banqueiros sabiam que as ações nada valiam, mas atraíam, com seu prestígio, os investidores ingênuos; e
3) os bancos manipulavam a formação dos preços das ações usando dinheiro de seus depositantes. J.P.Morgan Jr. confessou que tinha uma "lista preferencial" para clientes especiais.
Qualquer semelhança entre o que apurou o Relatório Pecora e o que sabemos sobre 2008 não é mera coincidência! É a evidência que o sistema financeiro mal regulado tende a voltar à cena do crime...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras
E-mail: contatodelfimnetto@terra.com.br








EL NUEVO CUERPO DEL CAPITALISMO


por GERMÁN CANO 07/01/2012
Las metáforas deportivas invaden el discurso del PP. Es el esnobismo neoliberal que hace recaer toda la responsabilidad de la crisis económica estructural en un desafío apolítico de autosuperación individual







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